Manaus (AM) – Em alusão ao Dia Nacional da Luta Contra a Endometriose, celebrado no último dia 13, o mês de março é destinado à conscientização mundial da doença que afeta cerca de 176 milhões de mulheres no mundo, sendo 8 milhões, brasileiras, conforme dados da Organização Mundial de Saúde.
Mas o que é a endometriose?
De acordo com o Ministério da Saúde, a endometriose é uma doença crônica que ocorre devido ao crescimento do endométrio (tecido que recobre a parte interna do útero e descama na menstruação) e que muitas vezes pode ser silenciosa e causar infertilidade.
Ainda de acordo com o Ministério da Saúde, no Brasil a endometriose afeta uma a cada dez mulheres entre as idades de 25 e 35 anos.
A Associação Brasileira de Endometriose informa que entre 10% a 15% de mulheres em idade reprodutiva, de 13 a 15 anos, podem desenvolver a doença e há 30% de chance de ficarem estéreis.
De acordo com a ginecologista Márcia Borges, a endometriose é uma modificação no funcionamento normal do organismo e se caracteriza pela presença de células endometriais fora da cavidade uterina.
“As células do tecido que reveste o útero (endométrio) ao invés de serem expulsas durante a menstruação, se movimentam no sentido oposto e podem atingir outros órgãos como os ovários, trompas, intestino e bexiga, afetando seus funcionamentos, onde voltam a multiplicar-se e a sangrar”,
explica a ginecologista
Borges alega que a dor é um dos sintomas mais comuns, pois a endometriose pode causar dores abdominais, cólicas menstruais fora do comum, nas relações sexuais e sangramento anormais.
Sintomas
Os sintomas, segundo a Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde:
– Dor em forma de cólica durante o período menstrual que pode incapacitar as mulheres de exercerem suas atividades habituais;
– Dor durante as relações sexuais;
– Dor e sangramento ao urinar e evacuar, especialmente durante a menstruação;
– Fadiga;
– Diarréia;
– Dificuldade de engravidar (a infertilidade está presente em cerca de 40% das mulheres com endometriose).
A especialista comenta que em cerca de 20% das mulheres a endometriose pode ser silenciosa e o diagnóstico começa pelos exames clínicos, que deve ser confirmado em exames laboratoriais e de imagem especializada.
O tratamento para a doença vai depender da necessidade de cada paciente, levando em consideração as queixas, extensão da doença e desejo da mulher, onde em alguns casos é indicado a realização de cirurgia.
“Os principais objetivos do tratamento da endometriose é o alivio da dor, prevenção do retorno da doença e a obtenção da gravidez para aquelas que desejam engravidar. Uma vez identificado o problema, o tratamento é feito com medicação hormonal para interromper a menstruação durante alguns meses e acompanhar se a mulher permanece sentindo dores, mesmo com a ausência de sangramento”,
explica.
“A cirurgia, quando indicada, ela deve ser minimamente invasiva e é indicada apenas em caso de falha do tratamento clínico ou quando as lesões oferecem prejuízo orgânico à mulher. No entanto, mesmo com o procedimento, a doença pode retornar, então é importante manter o acompanhamento médico”,
completa.
Como lidar com a endometriose
Em conversa com o Vanguarda do Norte, a jornalista Rosana Ramos, de 24 anos, antes de ser diagnosticada, já tinha ouvido falar da endometriose, porém não sabia muito a respeito.
Mas a realidade mudou em agosto de 2018, após uma crise inflamatória por causa de um cisto no ovário que ela não sabia que existia.
“Eu tive crise de vômito e muita dor na região da pelve, não conseguia andar, então precisava ficar na cadeira de rodas enquanto estava nos hospitais. Cheguei a ficar internada em 4 hospitais durante 3 dias e em todos os exames que fiz apontaram que havia um cisto no ovário”, relembra a jornalista.
“Saí com encaminhamento para ginecologista e ela me orientou a procurar um cirurgião de videolaparoscopia (cirurgia em vídeo) para tirar o cisto e em janeiro de 2019 eu fiz a retirada (acabei perdendo o ovário esquerdo também) e no laudo apontou que era um cisto de endometriose”, completa.
Rosana comenta que o fato de ter um plano de saúde facilitou o rápido diagnóstico da doença na rede privada, mas que também chegou a ir em hospitais públicos, onde orientaram ela a entrar na fila de espera.
Após o diagnóstico, a jornalista iniciou o tratamento de imediato para priorizar a sua qualidade de vida e evitar crises inflamatórias.
No caso de Rosana ela só teve a primeira crise aos 20 anos e os médicos acreditam que ela já nasceu com a endometriose, pois tem adenomiose (focos de endometriose exclusivamente no útero).
A diferença entre as duas doenças é que a endometriose é uma inflamação crônica, na qual o tecido endometrial cresce em regiões e órgãos no exterior da cavidade uterina, como nos ovários, bexiga e no intestino.
Já a adenomiose, é a doença em que o tecido endometrial invade o miométrio, camada intermediária de revestimento do útero e tem cura com a retirada do útero.
Segundo a jornalista, em relação ao procedimento cirúrgico da endometriose, no momento ainda não é recomendada pelos médicos, pois, o caso é leve e os focos são do tamanho de um grão de areia.
Rosana diz que atualmente consegue lidar melhor com a doença em comparação ao período de quando começou o tratamento.
“Até acertar o medicamento, foi mais de um ano testando todos os tipos de remédios que ajudavam a controlar as dores. Atualmente eu faço o uso de dois anticoncepcionais, eu tenho um chip injetável no braço e tomo diariamente um anticoncepcional via oral. Quando tenho dor, preciso tomar remédio forte que faz efeito em 10 minutos, mas já acostumei, pois preciso desses medicamentos para ter uma vida normal”, finaliza.
Grupo de apoio
A enfermeira Juliana Freire, de 26 anos, é uma das mulheres portadoras da doença em Manaus e durante a caminhada desde o diagnóstico ao tratamento, além da própria mãe, ela conheceu e encontrou outras mulheres com os mesmos problemas, quando resolveu criar o ‘Grupo De Apoio Às Portadoras De Endometriose Do Amazonas’ (Gapeam).
Freire relata que o grupo começou com apenas três mulheres e atualmente possui cerca de 200 integrantes.Entre as atuações do Gapeam estão encontros periódicos com profissionais, presença da família e da sociedade em geral.
O grupo também busca conscientizar não só as mulheres, mas a sociedade, e entrar no meio político para mostrar a pauta do movimento.
“Não temos a atenção que merecemos, mas já evoluiu bastante. E essa é nossa intenção desmistificar algumas coisas, de que sentir dor não é normal em nenhuma hipótese. Então a menina cresce com aquele pensamento ‘ah, sentir cólica é normal’. Claro que pessoas que não tem endometriose podem sentir cólica, mas não é aquela cólica incapacitante. E existem as mulheres também que são assintomáticas e descobre às vezes porque tem uma dificuldade de engravidar ou em um exame de rotina. Mas, a grande maioria possui sintomas. É uma doença que abala não só fisicamente como emocionalmente”, comenta.
Onde buscar ajuda
A enfermeira Juliana Freire, de 26 anos, é portadora de endometriose e além dela, sua mãe também. Por isso, criou o ‘Grupo de Apoio às Portadoras de Endometriose do Amazonas’ (Gapeam) para ajudar as mulheres que precisam de apoio emocional, muitas vezes.
Ela ressalta, que atualmente existem alguns desafios enfrentados durante a busca de diagnósticos no tratamento, além da falta de compreensão no âmbito familiar. E uma orientação adequada e correta pode melhorar a qualidade de vida das pacientes.
“Antes de encontrar os profissionais que acompanho hoje em dia, eu cruzei com muitos que disseram que eu tinha que tirar meu útero, que eu não ia conseguir ser mãe e falavam coisas que não deixa só a mim, mas eu já ouvi muitas histórias de mulheres que ficam muito frustradas com isso”, relata.
Freire está esperando a sua primeira filha após um longo caminho tratando a doença. O que parecia ser impossível, se tornou realidade, Mas a preocupação com a criança persiste, pois, Juliane vem de uma família que lida com a endometriose.
“A minha preocupação só aumenta em relação a isso, porque a minha filha é menina. Então, a minha mãe tem endometriose, eu tenho endometriose e eu venho recebendo muitas adolescentes que têm endometriose”, revela.
Outros desafios apontados estão no próprio Sistema Único de Saúde (SUS) que, segundo a enfermeira, atualmente não há exames específicos como ressonância com preparo intestinal, protocolo para endometriose, a ultrassonografia com preparo intestinal e também no apoio na atenção primária.
Tratamento público
A Policlínica Codajás é uma das unidades em Manaus que oferece o tratamento, onde, segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES-AM), anualmente cerca de 600 mulheres com endometriose são acompanhadas no setor de ginecologia.
Na Policlínica Codajás, o tratamento da endometriose pode ser feito, após consulta em uma UBS, de responsabilidade das prefeituras municipais, que encaminham as pacientes.
Durante as consultas e exames, o tratamento é feito com base em medicamentos e costuma ser indicado nos casos em que os focos de endometriose estão em um estágio inicial e não acometeram grandes áreas.