A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) promoveu, nesta quarta-feira (30), uma manifestação contra o Marco Temporal (PL 2903/2023) na Praça da Matriz, localizada no bairro Centro, zona Sul de Manaus. O ato, liderado pela Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amazonas (Apim) acontece em consonância com a mobilização nacional da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e iniciou junto da retomada da votação da tese no Supremo Tribunal Federal (STF), às 13h.
Presente na Praça da Matriz, a historiadora e integrante do Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEIAM) Izabel Cristine, de 25 anos, destaca que a manutenção das terras e da tradição indígena garante também a preservação da natureza.
“Os povos indígenas estão preservando a floresta muito antes desse debate vir à tona de maneira global. Fazemos parte dele e ela faz parte de nós. O Marco Temporal é uma ameaça aos nossos direitos e fere a nossa comunidade. Atinge de forma direta o Amazonas, destacando que Manaus é a cidade mais indígena do Brasil. Precisamos nos manter contra as teses porque condicionam a existência dos povos indígenas a partir de 5 de outubro de 1988 e isso é muito problemático, considerando que não eram nem considerados brasileiros antes disso”, afirma.
Na linha de frente do ato, a professora Danielle Gonzaga, de 41 anos, destaca que o Marco Temporal representa “mais um ataque à existência da diversidade”, afirma. “Nós que defendemos a diversidade de existência, entendemos que o Marco Temporal é uma tentativa de universalização de um direito, somente uma maneira de viver é defendida. Dizer não ao Marco Temporal é dizer sim à biodiversidade do planeta”, completa.
Há registros de manifestações nos estados da Amazônia Brasileira e diversos municípios do interior do Amazonas, como em Atalaia do Norte, município vizinho de Tabatinga (a 1.108 quilômetros de Manaus).
“Nós, povos indígenas do Vale do Javari, ocupamos as ruas de Atalaia do Norte manifestando nosso repudio a essa tese que vem ferir nossos direitos garantidos na Constituição. Simultaneamente, todas as nossas comunidades estão mobilizadas emanando boas energias aos nossos líderes e advogados indígenas que estão na linha de frente em defesa da vida e de nossos territórios. Mesmo distantes, nos somamos à nossas representações e nossas lideranças para dizer não ao Marco Temporal”, afirma a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA).
Em Boa Vista (RR), aproximadamente 2.500 lideranças indígenas reuniram-se para acompanhar a votação e protestar. Já em Brasília, 800 lideranças mobilizam-se no Museu Nacional desde a manhã para acompanhar a votação e para pressionar os parlamentares a votarem contra a constitucionalidade do Marco Temporal. A iniciativa contou com participação da comunicadora amazonense Samela Sataré Mawé, por meio da Apib.
Marco Temporal e a demarcação de terras
Pela tese, de autoria da Câmara dos Deputados por iniciativa do Deputado Federal Homero Pereira (PL/MT), os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em posse deles no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época. Indigenistas, lideranças comunitárias e estudiosos são contra o entendimento.
“Empresários e parlamentares do agronegócio estão pressionando, mas o movimento indígena não irá recuar. Estamos convocando todos os parentes e parentas, não indígenas, organizações parceiras e artistas para juntos construirmos uma grande mobilização permanente em Brasília. Vamos ocupar todos os espaços e pressionar para que o marco temporal seja derrubado de uma vez por todas”, afirma Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib.
O processo que motivou a discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, mas a posse de parte do território é questionada pela Procuradoria do Estado.
“A proposta é de acompanhar o julgamento e reforçar os próximos passos da luta no dia 31. Caso o Supremo prorrogue para outras datas o término da votação, o movimento indígena vai seguir mobilizado para acompanhar o julgamento até o Marco Temporal ser anulado. As organizações que compõem a Apib, mobilizaram no período de maio e junho mais de 129 manifestações em 21 estados, incluindo o Distrito Federal”, afirma a Articulação.
Apoio: Tatiana Nascimento.