A morte do presidente do Irã, Ebrahim Raisi, pode tornar o regime ainda mais agressivo e errático, com a ascensão de uma geração de líderes mais jovens, inseguros e violentos. Mais importante do que o cargo de presidente, Raisi, que morreu com a queda do helicóptero em que viajava, estava aparentemente sendo preparado para suceder o líder espiritual, Ali Khamenei, que concentra quase todo o poder no Irã.
Raisi era ultraconservador. Sua chegada ao poder em 2021 foi pavimentada pela ruptura do acordo nuclear, pelo então presidente Donald Trump, em 2018. O acordo havia sido costurado em 2015 pelo ex-presidente Hassan Rouhani, considerado um moderado no contexto da teocracia iraniana. Rouhani derrotou Raisi em 2017, quando se reelegeu, embalado pela euforia do acordo. Para obtê-lo, aceitou submeter o Irã ao regime de inspeções mais rigoroso e invasivo da história da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).
A ruptura do acordo foi sentida como uma traição do Ocidente e uma humilhação para o Irã. Ela enrijeceu as posições da teocracia iraniana, que retirou o pouco espaço político que restava aos líderes mais moderados. Raisi, ex-presidente do Judiciário, tinha as credenciais exigidas para esse ambiente de recrudescimento conservador. Como juiz em 1988, ele participou da condenação à morte de milhares de iranianos críticos ao regime, depois do fim da guerra Irã-Iraque.
Raisi, de 63 anos, foi o primeiro presidente em que Khamenei realmente confiou. Aos 85 anos, o líder espiritual parecia tê-lo escolhido para sucedê-lo, embora essa decisão não tenha sido tornada pública. A alternativa mais visível é o filho do líder, Mojtaba Khamenei, mas a ideia tende a provocar rejeição na teocracia, porque remete às dinastias persas, como a que os revolucionários islâmicos derrubaram em 1979, encabeçada pelo xá Reza Pahlevi.
A opção agora parece ser o aiatolá Ahmad Khatami, que como Raisi integra a Assembleia dos Experts, encarregada de eleger o líder espiritual. Como o presidente morto, Khatami representa a linha dura. A diferença é que ele não tem o mesmo prestígio angariado por Raisi nos últimos anos, no entorno do poder. A sucessão tenderá a enfraquecer ainda mais a já combalida teocracia, odiada por muitos iranianos que desejam mais liberdade e prosperidade, e sair da condição de pária internacional do país.
Haverá eleições para presidente dia 28 de junho, mas como nos casos anteriores os candidatos passarão pelo crivo de Khamenei. A muitos iranianos restará a opção de boicotar a votação.
Depois dos expurgos da geração de moderados que está associada à Revolução Islâmica de 1979, resta uma geração de líderes sem as mesmas credenciais, mais inseguros e mais violentos. Foram eles que, obviamente com a aprovação de Khamenei e Raisi, protagonizaram a repressão dos protestos pela morte de Mahsa Amini, em 2022, depois de ser detida porque supostamente o véu que usava não cobria todo o seu cabelo.
Essa geração emergente tende a ser ainda mais repressora e nacionalista. Se essa hipótese se confirmar, o Irã poderá acelerar seu programa nuclear, intensificar os ataques dos grupos que patrocina, como Hezbollah no Líbano, Hamas na Palestina, Houthis no Iêmen e milícias na Síria e no Iraque. Com isso, o Irã ficará ainda mais dependente da Rússia e China, a quem fornece armas e petróleo, respectivamente, em troca de cobertura política e financeira.