Em entrevista com a advogada Mary Tuma, conheça um pouco mais sobre o Direito Civil e pensamentos sobre uma lei, que muda constantemente.
Vanguarda do Norte: O que a motivou a escolher a área do Direito?
Mary Tuma: Um acidente automobilístico me motivou a fazer Direito, haja vista que por todos os danos sofridos eu não tinha paz emocional. Então eu fui estudar para entender, e claro, foi a minha primeira de muitas ações judiciais.
VDN: Há Quanto tempo você atua? E em que área?
MT: Há duas décadas sou advogada militante na área cível, principalmente no Direito de Família, Sucessões e Empresarial, mas atualmente estou bastante entusiasmada com o Tributário.
VDN: O que você poderia falar sobre os Direitos Humanos e qual a sua
importância?
MT: Os Direitos Humanos são o cerne de todos os direitos do cidadão, pois eles garantem a dignidade, a liberdade, a igualdade, a vida e os DH protegem contra os abusos de outros indivíduos e do próprio Estado. Esses direitos são inerentes a todos independente de raça, sexo, idade, situação econômica/ financeira, nacional ou estrangeiro. Não importa onde você esteja, esses direitos devem ser respeitados e todos nós devemos promovê-lo.
A ONU elaborou um documento oficial chamado “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, onde constam os direitos mais fundamentais do ser humano. No Brasil esses direitos foram sendo introduzidos na Constituição de 1934 e posteriormente na de 1988, esta avançou de forma mais alinhada com a Declaração dos Direitos Humanos da ONU, apesar de algumas interpretações, as vezes, não tão equilibradas na balança, no que tange ao criminoso e a vítima, virando inclusive alvo de ditado pejorativo de “Direito dos Manos”, isso tenta descredibilizar direitos fundamentais tão importantes para os países ocidentais democráticos que se inspiram para elaborarem leis para os seus cidadãos.
Com tal relevância também temos o “Tratado de São José da Costa Rica”, que estabelece os Direitos Humanos fundamentais para os países que são membros da OEA (Organização dos Estados Americanos), cujo tratado tem os mesmos objetivos da Declaração da ONU, especialmente os direitos civis e políticos dos cidadãos dos estados americanos.
VDN: Como você vê o direito dos cidadãos perante a lei?
MT: Eu acredito muito nas decisões dos magistrados, principalmente de primeiro e segundo graus, são profissionais preparados que conseguem atingir um correto convencimento do direito do jurisdicionado, porque sãos os primeiros a analisarem, levando em consideração não só as provas, mas também um conjunto de fatores que envolvem a fragilidade, a hipossuficiência, a vulnerabilidade e os hábitos culturais de quem mais necessita de justiça. Quando o litígio passa para a fase recursal nas Cortes Superiores, o mérito propriamente dito não será mais analisado e sim as formalidades legais do recurso. Justamente porque um processo deve ser maturado e isso envolve todas as fases processuais, sem pular as instâncias, obedecendo o direito à ampla defesa e o contraditório.
Por isso que o chamado “Foro Privilegiado” deveria ser extinto ou voltar a ser limitado, conforme o legislador constituinte determinou, haja vista a Corte mudar tal entendimento como se muda de toga, e isso prejudica o cidadão, a segurança jurídica e a confiança na Justiça.
VDN: Como você vê a segurança jurídica atualmente no Brasil?
MT: Essa questão vem mudando a passos largos de forma negativa no Brasil. Tanto os operadores do direito quanto o cidadão comum, não conseguem acompanhar as milhares de leis existentes no país. São leis federais, estaduais, municipais e vários tipos de normas, decretos, medidas provisórias, resoluções etc.
Atualmente a segurança jurídica no Brasil, está sendo prejudicada pelas constantes decisões das Cortes Superiores, principalmente no STF, cujos membros não respeitam a vontade do legislador constituinte, que já determinou todos os passos a serem seguidos, logo, não cabe outra função aos eminentes ministros, que não seja a de guardião da Constituição. Porém, hoje eles ultrapassam todas as competências dos outros Poderes, inclusive fazendo leis no lugar dos parlamentares eleitos pelo povo para esse fim.
A Corte hoje confunde propor leis com criar leis. Criar e elaborar leis é competência exclusiva do legislativo, enquanto propor leis, vários atores da administração pública podem fazer, tais como: o presidente da república, governadores, prefeitos, tribunal de justiça, procurador geral de justiça, ministros do STF e também os cidadãos, estes através da iniciativa popular.
Em decorrência de constantes mudanças de entendimentos jurídicos, principalmente quando ocorre uma seletividade dos interesses para subsumir a norma ao fato, a segurança jurídica não está sendo garantida no país.
VDN: Qual a mudança mais impactante no novo Código Civil para você?
MT: O novo Código Civil ainda não entrou em vigor. O que existe é um projeto de lei (PL 4/2025) que visa atualizar o Código Civil. Dentre várias reformas, as duas mais significativas são: a primeira é a ampliação do conceito de família, que passa a reconhecer a multiparentalidade e a socioafetividade, e a segunda é a mudança na divisão de bens, pois cônjuges e companheiros podem perder o status de herdeiros necessários, ou seja, ficarão atrás dos filhos e dos pais na linha de sucessão.
O PL 4/2025 ainda passará por uma comissão no Senado e quando for votado e aprovado, ocorrerá uma mudança muito significativa na vida dos brasileiros, como a união homoafetiva, alteração de regimes de bens em cartório, proteção no compartilhamento dos pets, relação nas empresas e no direito digital entre outros.
Há uma necessidade de atualizar as leis em decorrência das transformações sociais, econômicas e até tecnológicas que ocorreram ao logo desses 20 anos, desde a última reforma do Código Civil de 2002. Portanto, a mudança é necessária para aprimorar a segurança jurídica à nova realidade.
VDN: Dentro do Direito há justiça ou injustiça?
MT: Tanto a justiça quanto a injustiça dependem muito do ponto de vista de cada um, se você tem um pedido deferido, com certeza você sempre achará que foi feito justiça, e do contrário a injustiça.
Mas falando de um modo macro dentro do Direito, há sim justiça. O Direito é uma ciência que segue um protocolo, o qual nós chamamos de rito, porém, a lei apesar de ser perfeita, ela é inerte e necessita ser além de provocada, interpretada por alguém. Então entra não só a objetividade da lei, mas a subjetividade abstrata de quem está interpretando, e, este sujeito carrega consigo uma gama de fatores como a educação acadêmica que obteve ao longo da sua vida, a estrutura familiar, o convívio social, sua ideologia política, sua experiencia no ofício, ou seja, o seu meio cultural como um todo complementa e influencia para uma correta interpretação e um julgamento mais justo.
Sem o Direito o convívio social seria um verdadeiro caos!