Este ano, completam-se 20 anos desde a homologação da Lei 11.101 no Brasil, conhecida como Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falências.
Aprovada em 9 de fevereiro de 2005, ela representou um marco na modernização do direito empresarial brasileiro. Desde então, a legislação passou por uma grande atualização em 2020 (Lei nº 14.112) e se tornou pauta prioritária do governo federal em 2025.
Entenda as mudanças
Antes de 2005, o empresário em apuros deveria apelar para algo chamado concordata. Ela consistia em um processo judicial que tinha como objetivo ajudar a companhia em crise financeira a reestruturar dívidas e evitar a falência.
As regras desse sistema, contudo, eram mais rígidas e menos personalizáveis, além de priorizar o pagamento das dívidas em vez da manutenção da companhia.
“A concordata era automaticamente aplicada. O empresário tinha um prazo de até dois anos para poder pagar a dívida, e não havia participação ativa dos credores no processo”, explica Gustavo Gomes, sócio da área de Contencioso do SiqueiraCastro Advogados
“Cada vez que eu entrava em contato com o processo falimentar, sentia um incômodo permanente. Porque ele é um processo que começa com o fim; com a decretação de quebra”, diz Luis Felipe Salomão, vice-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e coordenador da FGV Justiça, em evento sobre o tema nesta segunda-feira (25)
“Além disso, o empresário que abrisse um processo era marginalizado. Havia muito preconceito”, adiciona.
A lei de 2005 pegou emprestado de modelos internacionais (especialmente do chamado Capítulo 11 norte-americano) e implementou uma mudança de paradigma. A partir dali, o que regia a lei era o princípio fundamental da preservação da empresa economicamente viável.
Na prática, isso significava dispositivos mais modernos e eficientes de manter o funcionamento da atividade empresarial. Reconhecia-se, ali, a função social das empresas e seu papel para a economia.
“Ela mudou como vemos a recuperação da atividade econômica, focado na manutenção dos empregos”, disse no evento o deputado Hugo Leal (PSD-RJ), relator da Lei nº 14.112/2020.
Além dessa mudança na base da lei, a legislação de 2005 introduziu o modelo de recuperação extrajudicial, que permite negociações diretas entre empresa e credores sem, obrigatoriamente, a presença da justiça. Ela também permitiu que produtores rurais pessoa-física entrassem em RJ.
O que aconteceu em 2020?
Em 2020, houve um aperfeiçoamento dos dispositivos legais de recuperação judicial e falências no país. A Lei n° 14.112 foi promulgada no dia 24 de dezembro.
Antes da Lei 11.101, o empresário que abrisse um processo de recuperação judicial era marginalizado.Luis Felipe Salomão, vice-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e coordenador da FGV Justiça.
As principais adições e mudanças foram as seguintes: regulamentação de algo chamado DIP Financing (que estabelecia garantias específicas para financiadores e criava condições mais favoráveis para a injeção de recursos nas empresas em crise); criação de um plano especial voltado especificamente às pequenas e médias empresas e maior cooperação entre jurisdições e procedimentos estrangeiros.
Uma pesquisa realizada em 2023 pela Deloitte, que avaliou a percepção de empresários em recuperação judicial e de membros da comunidade jurídica, afirmou que as mudanças criaram uma estrutura mais compatível com o dinamismo empresarial brasileiro e tinham potencial de desmistificar ainda mais os processos de recuperação judicial, extrajudicial e falências no Brasil.
A atualização da lei gerou um aumento expressivo nos pedidos de recuperação judicial. Em 2024, segundo dados da Serasa Experian, elas atingiram seu maior número — 2.273 solicitações — um aumento de 61,8% quando comparado a 2023.
O que vem à frente
Com os números expressivos enfrentados pelo Brasil, o governo federal indicou que o PL 3/2024 — que também atualiza o processo de RJ e falência no país — será pauta prioritária em 2025.
O texto encurta prazos para a conclusão da falência, diminui a burocracia no Judiciário e dá mais poder aos credores da empresa, que poderão nomear um gestor fiduciário para gerir o processo, em substituição à atual figura do administrador judicial escolhido pelo juiz.
“Credores, muitas vezes, gostariam de ter mais poder na indicação e na escolha desse administrador judicial para desigessar um pouco esse procedimento e trazer um pouco mais de credibilidade para o processo de uma forma ampla”, avalia Gustavo Gomes, do SiqueiraCastro Advogados.
No entendimento do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, os procedimentos da lei sancionada em 2005 são longos e prejudiciais ao país.
“No regime vigente, essas empresas são submetidas a um longo processo falimentar, comprometendo os recursos já insuficientes para a retomada das atividades e com impacto na recuperação dos recursos empregados pelos credores”, diz o ministro na mensagem que justifica o projeto.
A proposta também estava entre as prioridades do governo para 2024. O texto foi aprovado em março na Câmara e encaminhado ao Senado em abril, mas não chegou a ser distribuído para as comissões.