A definição de quem comandará a Presidência do Chile no período de 2026 a 2030 terá que esperar um mês, mas desde a noite de domingo (16) alguns sinais indicam qual candidato inicia com mais força a corrida para o segundo turno de 14 de dezembro.
Jeannette Jara, candidata governista, militante do Partido Comunista e representante do pacto Unidade pelo Chile, e José Antonio Kast, candidato opositor e fundador do Partido Republicano, avançarão ao segundo turno após serem os mais votados no 1º turno.
Com 99,6% das urnas apuradas, por volta das 01h50, em Brasília, Jara tinha 26,9% dos votos e Kast, 23,9%, segundo resultados preliminares do Serviço Eleitoral do Chile (Servel).
Antes das eleições, algumas pesquisas já projetavam um 2º turno entre Jara e Kast, mas previam números melhores para ela e mais baixos para ele.
No fim de outubro, a última pesquisa Plaza Pública Cadem estimava que Jara teria 30% dos votos e Kast, 22%. Neste domingo, ela ficou abaixo dessa marca e ele a superou.
Agora, para o próximo segundo turno, as pesquisas apontam uma disputa muito apertada. Kast já começou a receber apoio de outros candidatos — Johannes Kaiser, da ultradireita, e Evelyn Matthei, da direita tradicional —, o que lhe dá impulso na reta final.
Nessa definição eleitoral, a construção de alianças e os apoios que os demais candidatos derrotados anunciarem terão papel decisivo.
Jara e Kast: duas visões para o Chile
O avanço de Jara e Kast se explica, por um lado, pela fragmentação dos votos e, por outro, pelos polos opostos que ambos representam, apontam analistas.
Segundo especialistas, a participação de oito candidatos dificultou que algum deles atingisse a votação necessária para vencer no primeiro turno: mais de 50% dos votos.
Agora, Jara e Kast oferecem ao eleitorado duas opções situadas em extremos do espectro político.
Jara é uma política de esquerda que integrou um governo que, na visão da maioria dos chilenos, não conseguiu resolver os principais problemas do país nem melhorar a qualidade de vida.
Kast é um político de ultradireita com semelhanças a figuras como Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, e que afirma que governos de esquerda têm uma dívida histórica com o Chile.
Paulina Astroza, acadêmica especializada em Ciências Políticas e Sociais, considera que a principal diferença entre Jara e Kast está “na visão que têm sobre o papel do Estado na sociedade”.
Astroza disse ao podcast em espanhol da Universidade de Georgetown, “Y esto no es todo”, que Kast propõe um modelo “no qual o Estado seja o mais reduzido possível”, com menor gasto público e maior força da iniciativa privada.
Jara, por sua vez, defende um Estado “com um papel muito mais ativo na sociedade”, cuja missão principal seria melhorar as condições de vida da população e facilitar a convivência democrática.
Problemas nacionais que aguardam resposta
Um fator decisivo para o segundo turno será qual dos dois candidatos conseguirá se mostrar mais capaz de atender às principais preocupações dos eleitores: segurança pública e economia.
No tema da segurança, dados oficiais evidenciam que, somente entre 2023 e 2024, o número de vítimas de crimes no país subiu 10,8%.
Já na economia, o crescimento em 2024 foi de apenas 2,6%, insuficiente para gerar os empregos de que o Chile precisa e melhorar o padrão de vida.
Diante desse cenário, os eleitores terão duas opções: dar um voto de confiança em Jara, em favor da continuidade da esquerda e de suas promessas de ampliar direitos sociais e combater a desigualdade; ou, ao contrário, optar por uma guinada de 180 graus e escolher Kast, que defende um Estado menor e menos regulações.
Luz Araceli González, professora de Relações Internacionais do Tecnológico de Monterrey, disse à CNN que o que ocorre no Chile reflete uma tendência global de disputas políticas entre projetos que se situam em polos opostos.
“O Chile é um exemplo dessa polarização que vemos no mundo entre a frustração com o modelo democrático, liberal, de mercado, que não resolveu nada, e depois a chegada de governos mais à esquerda, com promessas, até com líderes um tanto messiânicos, que também não resolveram”, afirmou.
González prevê um segundo turno muito apertado, com uma diferença “mínima”, e alerta para fatores adicionais, como o peso da influência dos Estados Unidos.
“Não podemos negar que os EUA têm uma influência importante, a favor e contra. Mas qual projeto de país se imagina para o próximo governo? Boric não cumpriu todas as expectativas quando chegou ao poder, mas teremos um segundo turno com resultados muito apertados, o que reduzirá a legitimidade de quem vencer, devido à polarização”, disse a especialista.
Possíveis apoios rumo ao segundo turno
Para o segundo turno de 14 de dezembro, analistas chamam atenção para onde penderá o apoio dos seis candidatos derrotados.
Javier Aeloíza, coordenador acadêmico da Escola de Governo da Universidade Andrés Bello, disse à CNN que, nas próximas semanas, será importante observar como as forças políticas se reorganizarão em torno de Jara e Kast.
Algumas alianças começaram a surgir poucos minutos após o fechamento das urnas, enquanto os primeiros resultados apareciam no site do Servel.
O candidato de ultradireita Johannes Kaiser, do Partido Nacional Libertário, reconheceu a derrota em mensagem a seus seguidores e declarou apoio a Kast, alegando que a alternativa representada por Jara seria “mais do mesmo”.
Da mesma forma, Evelyn Matthei, candidata da direita tradicional e representante da coalizão Chile Vamos, parabenizou Kast, declarou apoio e até se dirigiu ao comitê de campanha dele, onde mais tarde o acompanhou no discurso aos seus apoiadores.
Até a noite deste domingo, Kaiser tinha 13,93% dos votos e Matthei, 12,56%. Se esses votos migrarem para Kast na segunda rodada, somarão ao seu 24,02% e o levarão a 50,51%, suficiente para elegê-lo presidente.
Jara, por sua vez, também buscou construir alianças desde sua primeira fala após ser confirmado o segundo turno. Diante de seus apoiadores, agradeceu aos que votaram nela e elogiou propostas de adversários como Matthei — que já havia declarado apoio a Kast —, além de Franco Parisi, Marco Enríquez-Ominami, Harold Mayne-Nicholls e Eduardo Artés, numa tentativa de atrair o respaldo deles e de seus eleitores.
Mas mesmo se Jara conquistar esses votos, ela chegaria a apenas 49,48%, ficando atrás do bloco que se forma ao redor de Kast.
Após este domingo (16), Jara avançou como líder ao segundo turno, mas o caminho pela frente promete ser difícil.

