O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta terça-feira (18) para condenar nove dos dez réus do núcleo 3 no processo que apura uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
O núcleo 3 é formado por nove militares — entre os quais os chamados “kids pretos”, integrantes das Forças Especiais do Exército — além de um agente da PF (Polícia Federal). O grupo teria planejado o assassinato de autoridades, como o presidente Lula (PT), o vice, Geraldo Alckmin (PSB), e o ministro Alexandre de Moraes.
Pela primeira vez no julgamento sobre a tentativa de golpe, Moraes votou para absolver completamente um réu. No caso do general Estevam Theophilo, o ministro considerou que as únicas provas remanescentes contra ele derivam da delação premiada de Mauro Cid, o que, segundo Moraes, gera dúvida razoável e impede a condenação.
Uma outra prova contra considerada pela denúncia seria um depoimento do ex-comandante do Exército Freire Gomes, no qual ele teria se dito incomodado com uma visita de Teóphilo à casa de Bolsonaro, especialmente diante do cenário de tensão da época. No entanto, durante o trâmite da ação penal, Freire Gomes retificou a declaração, afirmando que ficou sabendo que nada ilegal foi tratado na reunião.
Durante julgamento nesta terça, Moraes — que é relator do caso na Corte — pediu a condenação de outros sete réus pelos cinco crimes que constam na denúncia:
- Organização criminosa armada;
- Golpe de Estado;
- Tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito;
- Dano qualificado ao patrimônio da União;
- Deterioração do patrimônio público.
No voto de quase três horas, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que as provas mostram que a maioria dos réus do núcleo 3 atuaram na criação de narrativas falsas sobre fraude nas eleições, especialmente entre o primeiro e o segundo turno, como estratégia para desacreditar o resultado das urnas e preparar ambiente favorável à ruptura institucional.
Moraes destacou que mensagens obtidas durante as investigações revelam discussões sobre uso de tropas, pressões sobre o alto comando do Exército e ações de monitoramento de autoridades a partir de 21 de novembro de 2022. Esse conjunto de atos, afirmou, demonstra unidade de propósitos entre os réus e conexão direta com o núcleo 1 da trama golpista, liderado por Jair Bolsonaro.
Para o ministro, ficou evidenciado que o grupo buscava cooptar militares, organizar uma intervenção armada e planejar a formação de um gabinete de crise após a consumação do golpe.
No caso dos réus Márcio Nunes de Rezende Júnior e Ronald Ferreira de Araújo, Moraes votou para condená-los por incitação ao crime e associação criminosa.
Ao analisar individualmente esses dois acusados, Moraes propôs desclassificar as imputações, afirmando que, embora não haja provas suficientes de vínculo associativo com a organização criminosa, ambos incitaram animosidade contra as Forças Armadas conjuntamente com outras pessoas. Por isso, deveriam ser condenados por incitação e associação criminosa.
Por serem crimes mais brandos que os imputados na denúncia, é possível que ambos façam acordo de não persecução penal com a PGR, se admitirem esses delitos.
O ministro Cristiano Zanin é o próximo a manifestar seu voto. Em seguida, apresentam seus pareceres os ministros Cármen Lúcia e Flávio Dino (presidente do colegiado), nesta ordem.
Quem são os réus do núcleo 3?
- Bernardo Corrêa Netto: Coronel do Exército. Segundo a PGR, pressionou o comandante do Exército para apoiar o golpe; organizou encontros de militares das Forças Especiais e incentivou a divulgação de uma carta dirigida ao Comandante do Exército, com o objetivo de influenciar a Alta Cúpula a aceitar o decreto de ruptura democrática.
- Estevam Theophilo: General da reserva. Segundo a PGR, estimulou Bolsonaro a assinar o decreto golpista e se comprometeu a coordenar a ação militar para consumar a ruptura, caso o ato fosse formalizado. Também atuou para pressionar o então comandante do Exército, visto como possível obstáculo ao golpe.
- Fabrício Moreira de Bastos: Coronel do Exército. Teria participado das reuniões de kids pretos e ajudado a formular diretrizes estratégicas para a execução do golpe. Produziu o documento “Ideias Força”, que propunha ações para acelerar a adesão interna no Exército e disseminar operações de desinformação e mobilização.
- Hélio Ferreira Lima: Tenente-coronel do Exército. Teria sido o autor da “Operação Luneta”, documento que detalhava fases do golpe: prisão de ministros do STF, gabinete de crise, controle das instituições e campanha de desinformação. Também participou do monitoramento do ministro Alexandre de Moraes.
- Márcio Nunes de Resende Júnior: Coronel do Exército. Cedeu seu prédio reunião dos “kids pretos” e integrou a articulação para influenciar superiores. A PGR destaca que aderiu ao plano golpista mesmo sabendo da inexistência de fraude eleitoral.
- Rafael Martins de Oliveira: Tenente-coronel do Exército. Teria sido coidealizador da operação “Copa 2022”, que pretendia sequestrar e matar Alexandre de Moraes. Fazia a gestão de recursos financeiros para a execução dos planos golpistas. Parte desse dinheiro, teria sido repassado a Mauro Cid pelo então candidato à vice-presidência Walter Braga Netto.
- Rodrigo Bezerra de Azevedo: Tenente-coronel do Exército. Segundo a PGR, também atuou na operação “Copa 2022” e participou diretamente do monitoramento de Alexandre de Moraes. Usou técnicas de anonimizarão e aparelhos clandestinos para ocultar a operação.
- Ronald Ferreira de Araújo Júnior: Tenente-coronel. Teria assinado e divulgado carta de pressão ao então comandante do Exército, mas, segundo a PGR, não há prova de sua participação direta no núcleo golpista. A procuradoria reconsiderou a denúncia e pediu condenação de Ronald somente por incitação à animosidade entre Forças Armadas e instituições.
- Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros: Tenente-coronel. Segundo a PGR, atuou na difusão pública e digital da carta de pressão e buscou enfraquecer autoridades militares que resistiam ao golpe, apesar de saber que alegações de fraude eram falsas.
- Wladimir Matos Soares: Agente da Polícia Federal. Teria fornecido informações estratégicas da segurança da posse presidencial ao grupo bolsonarista e auxiliaria na etapa de assassinato de autoridades para criação de caos social e justificativa de medidas de exceção.

