Na mesma semana em que é celebrado o Dia da Independência do Brasil (7 de setembro), os amazonenses têm um motivo a mais para comemorar. Nesta terça-feira, dia 5 de setembro, completam 173 anos em que o Amazonas foi elevado à categoria de Província. Nessa mesma data, mais necessariamente em 1850, a antiga capitania de São José do Rio Negro — como era chamado o Estado — deixou de pertencer à Província do Grão-Pará e se tornou independente.
A elevação do Amazonas à categoria de Província é o resultado de um processo que começou quase três décadas antes do acontecido. Em entrevista ao Vanguarda do Norte, o historiador Davi Avelino ressalta que, com a Independência do Brasil, em 1822, os antigos territórios coloniais pertencentes a Portugal, aqui na América (capitanias reais e hereditárias), foram transformados em Províncias.
Segundo Avelino, havia a esperança de que a Capitania de São José do Rio Negro fosse transformada em Província, mas não foi o que aconteceu em 1823. Essa região — hoje, estado do Amazonas — ficou subordinada à Província do Pará como Comarca do Alto Amazonas.
Ele ressalta que, com a preocupação da Corte, situada no Rio de Janeiro, com a questão do melhor controle das fronteiras, necessidade de uma maior capilaridade no esquadrinhamento dos territórios e em parte devido às pressões das elites locais, decidiu-se criar mais duas províncias no início dos anos de 1850: a Província do Amazonas e a Província do Paraná. Nesse contexto, de pós-cabanagem e de emergência da economia da borracha, é que foi criada a Província do Amazonas em 1850.
“Isso significava, na prática, autonomia para que as elites locais e adventícias pudessem estruturar as redes de poder, acessar recursos (terras) e aumentar os dispositivos de vigilância e controle (trabalho) em regiões próximas às fronteiras. Os debates levaram uns 28 anos para a criação da Província do Amazonas. Desde o início da década de 1820 até o final da década de 1840”, explica.
O historiador pontua, ainda, os possíveis desafios enfrentados pelos povos originários na segunda metade do século XIX. Davi Avelino levanta a hipótese de que os povos indígenas podem ter sido vítimas da política e dos interesses econômicos do Estado, além de setores da sociedade brasileira.
“Para os povos indígenas, talvez um aumento da pressão relacionada às formas compulsórias de trabalho, diluindo ainda mais as tênues fronteiras entre o trabalho livre e trabalho escravo. Essa data marca, portanto, esse ideário de autonomia do Amazonas (Província), servindo como importante marco histórico para as elites e, de certo modo, para as pesquisas sobre a nossa história. No entanto, pouco mudou ou transformou negativamente a vida das populações locais”, frisa.
Um dos mais proeminentes criadores de arte do Amazonas, o artista visual e doutor em História, Otoni Mesquita, ressalta que falar sobre a importância do dia 5 de setembro é destacar bastante sobre a história econômica e política do Amazonas. Ele enfatiza, ainda, que a data celebra o momento em que o Estado foi elevado à categoria de Província, mas que a instalação só ocorreu em 1º de janeiro de 1852.
“Foi a partir dali que iniciam os trabalhos, no sentido de organizar a Província, de ter autonomia, de se articular tudo, ainda que inicialmente dependendo do Grão-Pará. Mas é a partir do seu primeiro presidente, que era o João Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha, que o Amazonas começa a se estruturar com suas várias obras e vários setores, inclusive, da construção civil e todos os outros [setores] passavam a ter uma organização mais local, ainda que continuasse dependendo das decisões da Côrte e, portanto, as coisas eram um pouco mais demoradas. A gente só vai ter uma autonomia mais evidente no período da república, basicamente, eu diria que foi muito importante o aprendizado da autonomia política, econômica, enfim, em todos os setores que foi possível a partir daquela data”, diz.
Entenda a separação entre Amazonas e Pará
Décadas antes da Elevação, a autonomia já era um desejo da população e de políticos. À época, o Pará alegava que o Amazonas não tinha condição de sobrevivência com a economia fraca, mas Belém exportava tudo o que era produzido aqui. Com a mudança da Família Real para o Brasil, foi permitida a instalação de manufaturas e o Amazonas começou a produzir algodão, cordoalhas, manteiga de tartaruga, cerâmica e velas.
Em meados do século XIX, foram fundados os primeiros núcleos que deram origem às atuais cidades de Borba, Itacoatiara, Parintins, Manacapuru e Careiro. A capital foi situada em Mariuá (entre 1755-1791 e 1799-1808), e em São José da Barra do Rio Negro (1791-1799 e 1808-1821). Uma revolta em 1832 exigiu a autonomia do Amazonas como Província separada do Pará.
A rebelião — intitulada de Cabanagem ou Guerra dos Cabanos — foi sufocada, mas os amazonenses conseguiram enviar um representante à Corte Imperial, Frei José dos Santos Inocentes, que obteve no máximo a criação da Comarca do Alto Amazonas. Foi então que Dom Romualdo Antônio de Seixas, deputado e bispo católico que defendeu por diversas vezes a autonomia em discursos na tribuna da Assembleia Geral do Império, criou o projeto para separar as duas regiões.
Com isso, o Amazonas manteve-se fiel ao governo imperial e não aderiu à revolta. Como espécie de recompensa, o Amazonas se tornou uma província autônoma em 1850, confirmada segundo a Lei nº 582, de 5 de setembro de 1850.
Vale ressaltar que, apesar de no documento constar o dia 5 de setembro, a instalação na prática só aconteceu dois anos depois, com a participação do primeiro presidente da Província do Amazonas, João Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha, e uma das personalidades mais relevantes para esse período. Ele foi uma das pessoas que mais lutou pela independência da região, junto com Dom Romualdo de Seixas.
Outra personalidade da época — e apoiador de Tenreiro Aranha — foi Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, que prestou grande contribuição à indústria local e do país. Geraldo dos Anjos destaca a importância de se manter viva essa história.
Programação
Uma programação especial em Manaus marca, todos os anos, o 5 de setembro, integrando-se às celebrações da Semana da Pátria. Haverá uma solenidade póstuma ao defensor da independência política do Amazonas em relação ao Pará, Tenreiro Aranha, às 7h, horário local, na Praça 5 de Setembro, conhecida também como Praça da Saudade, no Centro da capital, onde há um monumento em homenagem a ele e que faz alusão à elevação do Amazonas à categoria de Província.
O evento, que terá a duração de 1 hora, aproximadamente, vai contar com a participação de agentes da Polícia Militar do Amazonas (PMAM), do Corpo de Bombeiros Militar do Amazonas (CBMAM), da Marinha do Brasil, Força Aérea Brasileira (FAB) e do Exército Brasileiro.
A banda da PMAM e do Exército estarão presentes na programação. Durante o evento, uma coroa de flores será colocada por policiais femininas do Comando de Policiamento Especializado (CPE) da PMAM na estátua de Tenreiro Aranha.