Manaus (AM) – Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), o Amazonas diminuiu 22% dos casos de violência contra a mulher no ano de 2022. Considerado um progresso em relação aos anos anteriores, a plataforma também apontou que o Amazonas está entre os dez estados brasileiros que melhoraram o indicador de crimes violentos no país.
Em relação aos estados do Norte, o Amazonas apresenta o terceiro maior percentual de melhora desses números, ficando atrás apenas do Amapá, que reduziu 65% e Tocantins, que reduziu 51%. A média nacional registrou a diminuição de 8% de casos em relação ao ano de 2021, enquanto o Amazonas se sobressaiu com 22%.
Resultado das ações contínuas da rede de proteção integrada pela Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM), o órgão de segurança pública informou que o número de denúncias aumentou, pois as mulheres se sentem mais seguras em delatar seus agressores, como explica a delegada responsável pela especializada, Débora Mafra.
“O aumento das denúncias, a rede de proteção de amparo integral às vítimas e as campanhas realizadas pela delegacia incentivam para que outras mulheres denunciem novos casos, demonstrando confiança em nosso trabalho. A maioria das vítimas que nunca denunciaram seus agressores são as que morrem em feminicídio, isso é um dado nacional. É como se fosse uma vacina, a prevenção é a denúncia’’, declarou a delegada.
Infelizmente, em nossa sociedade, é comum saber de casos onde mulheres são vítimas de violências diárias, independente de classes sociais ou tipos de agressões, pois nenhuma mulher está isenta.
‘‘Geralmente, as denunciantes têm de 18 a 30 anos, vivem com seus agressores e possuem seus respectivos trabalhos. Em primeiro lugar nós recebemos muitas denúncias de violência psicológica, em segundo é injúria e em terceiro, lesão corporal. É interessante que a violência psicológica está anexa a todos os crimes, por isso que ela ganha em primeiro lugar, porque é difícil você sofrer uma violência física sem antes ter sofrido uma violência psicológica’’, comenta Débora.
Apesar da diminuição nos casos de violência contra a mulher no Amazonas, sabemos que ainda existem muitas vítimas que não denunciam por medo de represálias, por medo de julgamento da sociedade, ou até mesmo, os próprios agressores as culpam pelos ataques.
Rede de Proteção
Como forma de resguardar a vida da denunciante e dar o suporte que a mesma necessita para seguir sua vida, a Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher conta com uma rede integrada de órgãos que atuam em prol da segurança física e mental daquela mulher que se apresentou formalmente para denunciar seu agressor.
Por meio da Polícia Civil, a mulher pode solicitar uma medida protetiva com urgência, serviço que é facilitado pela delegacia, não demorando para chegar nas mãos do juiz. Através da resolução, o agressor pode ser retirado do local onde a vítima reside, assim como impede que ele tente se comunicar com a mulher ou a família. Caso descumpra a medida protetiva, o acusado pode ser preso em flagrante ou pode ser preso de forma preventiva.
Através da SAPEM, anexo a Delegacia da Mulher, a vítima conta com o Serviço de Apoio Emergencial à Mulher em casos de violência doméstica na parte psicológica e assistencial.
Dentro do serviço, a mulher também pode conseguir encaminhamento jurídico; se precisar, ela pode se instalar na Casa Abrigo, que é fornecida pela rede, além do Alerta Mulher, que é um aplicativo desenvolvido para rastrear vítimas e solicitar ajuda em casos de perigo.
Integrando a rede de apoio, o programa da Polícia Militar, Ronda Maria da Penha, é responsável por fiscalizar medidas protetivas de emergência, realizando também visitas às vítimas até que as mesmas se sintam totalmente seguras. Além do programa, as mulheres também contam com a ajuda do CREAM (Centro Estadual de Referência e Apoio à Mulher), que incentiva a realização de cursos profissionalizantes e reinserir essa vítima no mercado de trabalho.
O esquema de proteção foi formado para que cada vez mais as mulheres se sintam mais seguras em formalizar suas denúncias, além de receber assistência para cuidar da sua saúde mental que já foi desgastada com as constantes agressões.
Violência no contexto da pandemia
Com a chegada da pandemia no Brasil em 2020, os governos e prefeituras pediram para que as pessoas respeitassem o isolamento social que tentava frear a proliferação do vírus mortal. Enquanto tentavam resolver um problema, outros foram surgindo, como a violência doméstica, por exemplo.
Mantendo as pessoas em casa, agressores e vítimas ficavam no mesmo espaço durante o dia todo, aumentando consideravelmente o número de mulheres agredidas em suas residências. Um estudo encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em conjunto ao Instituto Datafolha, revelou que durante o primeiro ano de pandemia, cerca de 24,4% das mulheres acima de 16 anos (uma em cada quatro) afirmaram ter sofrido algum tipo de violência ou agressão no contexto da Covid-19, ou seja, aproximadamente 17 milhões de mulheres sofreram violência física, psicológica e/ou sexual nos primeiros 12 meses de pandemia.
Aqui no Amazonas, a Delegada Débora Mafra revelou que houve uma mudança de comportamento no perfil dos agressores, uma vez que o laço consanguíneo não isentava as mulheres de serem vítimas de sua própria prole.
“Tivemos um aumento de casos onde filhos agrediram suas mães. Eu achei interessante também porque não ficou só no marido ou no ex-marido, mas houve um aumento considerável onde os filhos passaram a ser violentos com suas mães; inclusive, tivemos dois feminicídios nesse contexto durante a pandemia, foi perceptível a mudança de comportamento’’.
Núcleo de Combate ao Feminicídio
Inaugurado em 2020, o Núcleo de Combate ao Feminicídio (NCF) vem dando atenção aos casos de violência contra as mulheres, com o apoio da Polícia Civil do Amazonas. Com pena de 12 a 30 anos de reclusão, o serviço foi expandido para intensificar as ações junto a delegacia especializada.
“O feminicídio, apesar de ser um crime grave, na maioria das vezes é inevitável. Antes de ser consumado, os autores agridem as vítimas verbalmente ou psicologicamente. Então, a violência avança para o sentido físico e, posteriormente, para o ápice, que é a morte. Ou seja, existe uma escalada da violência até o crime ser consumado”, explicou a coordenadora do NCF, Delegada Marília Campello.
Atuando nas dependências da Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), na Avenida Autaz Mirim, bairro Jorge Teixeira, Zona Leste de Manaus, o núcleo vem servindo como um apoio para as ações de combate, principalmente nas ocorrências da região.
Casos de feminicídio no Amazonas
Em janeiro de 2023, Renata Costa da Silva, de 26 anos, foi morta a paulada pelo seu companheiro, Dorisvaldo da Silva Mota, de 25 anos, no município de Coari, interior do Amazonas. Renata estava grávida de nove meses e foi agredida até a morte, o bebê morreu ainda na barriga da mãe.
O caso chocou a população pela brutalidade, uma vez que o agressor era companheiro da vítima e pai da criança que ainda não havia nascido. Segundo os familiares, Renata planejava pedir a separação de seu marido devido às constantes agressões que sofria, mas por não aceitar o fim do relacionamento, Dorisvaldo assassinou a vítima sob o efeito de drogas.
Renata estava vivendo o que costumamos caracterizar como relacionamento abusivo, uma vez onde o homem não respeita a decisão da mulher e impõe medo sob o pretexto de violência. É impossível não sentir medo de passar pela mesma coisa que Renata passou, principalmente se você for mulher.
‘’Desconfie mais de seu companheiro, porque a gente acha que nunca aquele companheiro que diz que nos ama todos os dias, que está junto da gente, tem coragem de tirar nossa vida, mas por esse fato que ocorreu em Coari, nós percebemos que é um risco que corremos. Por isso o valor da denúncia, o quanto antes denunciar melhor para a vítima’’, salientou Mafra.
Passos para identificar um relacionamento abusivo
A Delegada Débora Mafra apontou alguns comportamentos que caracterizam o relacionamento abusivo entre casais. Apesar de serem passos simples, muitas mulheres possuem uma deficiência emocional para aceitar que estão sendo prejudicadas mentalmente por seus parceiros. Se você vive ou desconfia que alguém que está inserida nesse contexto, fique em alerta para as seguintes situações:
1- Homem que se apresenta como gentil, mas em pouco tempo apresenta um ciúmes excessivo
2- Isolamento da mulher do círculo de amigos e família, uma vez que o homem trata a mulher como objeto exclusivo, impedindo a vítima de pedir ajuda
3- Pular a fase de conhecer o parceiro, uma vez que os homens já querem morar junto e casar com as vítimas
4- Palavras e comportamentos rudes, menosprezando os sentimentos de suas companheiras
Como denunciar
Para denunciar casos de violência contra a mulher, a vítima pode comparecer à sede da Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher, localizada na Rua Recife, Conjunto Eldorado, Parque 10 de Novembro, Zona Centro-Sul de Manaus. Na unidade, a vítima pode solicitar medida protetiva e a busca de pertences na casa em que o agressor se encontra, se necessário.
De forma anônima, a população pode realizar denúncias de violência através dos canais 180 e 181, onde a delegacia irá investigar a situação e dar suporte a vítima para que a mesma compareça à delegacia para realizar a denúncia.
Caso você presencie alguma violência contra a mulher, também é possível pedir ajuda através do 190, pedindo suporte a Polícia Militar, que pode prender o suspeito em flagrante antes que o feminicídio aconteça.