O Brasil e o Paraguai fecharam um novo acordo-base para o Anexo C do Tratado de Itaipu, que define as condições de comercialização da energia gerada pela megausina hidrelétrica.
As linhas gerais do entendimento foram acertadas na manhã desta terça-feira (7) pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira; e o presidente paraguaio, Santiago Peña; em uma reunião em Assunção.
Fontes do governo brasileiro relataram os termos principais do novo acordo, que substituirá as regras em vigência desde 1973, quando foi firmado o tratado.
A partir de 2027, a tarifa de Itaipu ficará entre US$ 10 (R$ 50,54) e US$ 12 (R$ 60,65) por kilowatt (kW), remunerando apenas os custos de operação e manutenção (O&M) da usina.
É uma queda de 30% em relação ao preço atual da energia gerada pela hidrelétrica e praticamente metade do valor praticado até 2021.
O efeito deverá ser sentido pelos consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste – que recebem, por meio de suas distribuidoras, a eletricidade de Itaipu.
O novo acordo não se resume à questão tarifária. Também a partir de 2027, o Paraguai poderá vender sua parte da energia de Itaipu ao mercado livre no Brasil, que negocia seus contratos sem amarras de preço e de prazo, conforme a oferta e a demanda de eletricidade.
A produção de Itaipu é dividida meio a meio. No entanto, o país vizinho não consome toda a sua parcela. Com isso, dos 50% dos megawatts que pertencem ao Paraguai, cerca de 35% são mandados para o Brasil.
Hoje essa energia tem um valor fixo, definido anualmente, e suas cotas são alocadas para as distribuidoras de energia de três regiões do país – Sul, Sudeste e Centro-Oeste.
Com acesso ao mercado livre, os paraguaios poderão vender seus megawatts diretamente para a indústria brasileira, por exemplo, com contratos de longo prazo e preços variáveis (conforme o cliente).
A “metade brasileira” de Itaipu, ou seja, os 50% da energia que pertencem ao Brasil continuarão sendo alocados ao mercado regulado (distribuidoras).
Itaipu tem 14 mil MW de potência instalada – é a maior usina hidrelétrica das Américas – e foi construída na década de 1970.
Para erguê-la, foi contraída uma dívida hoje estimada em pelo menos US$ 13 bilhões, que terminou de ser paga apenas em fevereiro de 2023.
A revisão do Anexo C estava prevista para ocorrer 50 anos após a assinatura do tratado, mas acabou não ocorrendo no momento imaginado – o que não chega a ser surpreendente, na avaliação de vários negociadores.
Basta ver o que aconteceu em Yaciretá: a usina binacional, com 3.200 MW de potência (menos de um quarto de Itaipu), é objeto de renegociação entre Paraguai e Argentina desde 2014. Há dez anos os dois países tentam um novo acordo sobre as condições de comercialização da energia de Yaciretá.
O entendimento celebrado pelo ministro Alexandre Silveira e pelo presidente Santiago Peña estabelece um prazo de seis meses para o acerto dos detalhes e para o envio do novo Anexo C aos legislativos de ambos os países.
Para entrar em vigência, o ajuste no Tratado de Itaipu precisa de ratificação parlamentar, como é o caso de todos os acordos internacionais.
Curto prazo
Silveira e Peña acertaram ainda um novo valor para a tarifa de Itaipu até 2026.
O chamado Cuse – sigla para o Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade – está em US$ 16,71 (R$ 84,45) por kW e vai para US$ 19,28 (R$ 97,44). O Paraguai pedia US$ 22,70 (R$ 114,72).
No Brasil, segundo fontes do governo, o efeito para os consumidores finais será zero. O aumento será neutralizado por um “cashback” de US$ 300 milhões de Itaipu nas contas de luz.
Funciona da seguinte forma: Itaipu vende a energia que pertence ao Brasil para a ENBPar (estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia), que repassa esses custos para as distribuidoras de energia.
O aumento da tarifa para U$ 19,28 por kW gerará uma despesa adicional de US$ 300 milhões à ENBPar. Porém, Itaipu “devolverá” esse mesmo valor à estatal por meio de um aporte, a fim de neutralizar os efeitos para o consumidor brasileiro.
Essa engenharia financeira toda permitirá, no fim das contas, elevar os recursos recebidos pelo Paraguai na venda de energia em seu território — mas sem impactos no Brasil.
O valor do Cuse ficou em US$ 22,60 entre 2009 e 2021. Com a redução da dívida de Itaipu, baixou para US$ 20,75 em 2022. Em 2023, foi para US$ 16,71.
No setor elétrico, uma das grandes críticas é que esse valor já poderia ser menor com a quitação total da dívida.
A diferença entre o custo operacional da usina e o valor efetivo da tarifa tem sido usada, essencialmente, para ampliar o financiamento de Itaipu a projetos socioambientais – em vez de uma tarifa de energia mais baixa.
A hidrelétrica ampliou sua atuação para 434 municípios – antes era apenas a vizinhança de Foz do Iguaçu (PR) – e está bancando a construção da nova ponte internacional entre Carmelo Peralta (Paraguai) e Porto Murtinho (MS), a mais de 700 quilômetros de distância da usina.
Além disso, nesta segunda-feira (6), foi assinado um convênio com o governo do Pará e a prefeitura de Belém para obras de infraestrutura urbana no valor de R$ 1,3 bilhão.
Os recursos, saindo do caixa de Itaipu, vão preparar a capital paraense para a COP30 – conferência climática da ONU em 2025.
O repasse bilionário foi duramente criticado pelo setor elétrico, que viu uma oportunidade desperdiçada de reduzir as contas de luz no Brasil e um desvirtuamento dos propósitos socioambientais de Itaipu.
Fonte: CNN Brasil
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