Manaus (AM) – Quem não conhece um amigo ou parente que está negativado? Apesar da conta no vermelho ser uma das condições que mais assusta a população brasileira, pesquisas apontam que essa já é a realidade de mais de 70 milhões de pessoas acima de 18 anos no Brasil.
A inadimplência é uma questão nacional, porém o Amazonas ocupa a terceira posição do ranking de devedores (atrás apenas do Rio de Janeiro e Amapá), e já ocupou o primeiro lugar no período da crise da Covid-19.
Cartão de Crédito
A pendência em bancos e cartão de crédito segue sendo o maior causador de dívidas, e, de acordo com dados do Serasa Experian, em setembro do ano passado o país contava com 68,4 milhões de inadimplentes.
O consumismo está impregnado na estrutura da sociedade, tendo em vista que o modelo econômico predominante é o capitalismo, e esse muitas vezes é um fator de pressão para o indivíduo ter um produto que está fora da sua realidade social para se encaixar em algum grupo. As compras em valores mais altos costumam ser realizadas em cartão de crédito e parceladas, o que pode ocasionar atraso no pagamento da fatura, e, logo, a negativação do nome.
O caso de Camila Castro não é diferente. A jovem de 24 anos era atendente de caixa e perdeu o emprego, mas antes decidiu comprar um smartphone no seu cartão de crédito e afirmou que agora se tornou inviável pagar as parcelas.
“Agora tenho que priorizar outras coisas para pagar, estou desempregada e infelizmente terei que vender meu celular para limpar meu nome”,
declarou.
Para o economista Orígenes Martins, o fato de o Amazonas ter sido um dos estados que manteve um equilíbrio econômico razoável durante as crises de Covid-19 pode ter desencadeado o forte uso do cartão de crédito.
“A sensação de estar bem e de ter renda tem levado a população amazonense a ter usado a sua compulsão, que é própria do ser humano”.
De acordo com a pesquisa do Serasa, as dívidas com cartão estão concentradas em 65% em supermercado, 48% com roupas, calçados e eletrodomésticos, na sequência vem 41% com remédios ou tratamentos médicos, e por fim, compras de alimentos por delivery e gasto com combustíveis para o automóvel com 22% cada.
Orígenes Martins ressalta que, no Brasil, as pessoas chegam a pagar juros de até 300%. O economista critica os ataques que o governo tem feito ao Banco Central pelo fato da política de juros, como a taxa Selic que é 13,75%, que apesar de alta, não é essa taxa que o cidadão paga.
“A pessoa paga a taxa de mercado, que chega a 300% no cartão de crédito. Isso é que o governo deveria se preocupar, atacar, tentar diminuir. Mas ficam colocando o banco central como vilão, quando na verdade é o sistema bancário que tem sido vilão da economia no momento”,
declarou o economista.
Desemprego
Os índices da taxa de desemprego em 2022 foram menores do que 2021, no entanto os números ainda são altos no Amazonas, e a crise em âmbito nacional e estadual é um reflexo na hora de pagar as contas, sendo levado em conta o que deve ser priorizado.
Além dos números de pessoas negativadas, as dívidas também subiram o valor. Em média, cada inadimplente deve R$ 4.612,30. Em janeiro de 2018, era R$ 3.926,40. Com a falta de renda, surge as prioridades que cada cidadão deve fazer, em vista que o preço dos produtos e serviços estão altos.
O aperto chega no fim do mês para Aline Souza, empregada doméstica aos 33 anos, que recebe um salário mínimo (R$ 1.320).
“Para limpar meu nome preciso que sobre dinheiro, e isso não acontece. É o gás caro, alimentos básicos caro, energia e aluguel. É aquilo que falam né, estamos sobrevivendo e não vivendo”,
declarou.
A situação da doméstica não é diferente da maioria da população. No Amazonas, ainda se há o fator de que não é apenas a capital que deve ser dado o acesso de recursos, há também outros 62 municípios que contam para economia do Estado, como diz a economista Denise Kassama.
“O Amazonas não é só Manaus, há uma população do interior que sabemos que a logística para lá é pior. Chegar produtos para o interior é mais caro e a atividade econômica em boa parte dos municípios é mais baixo, então acabam puxando esses indicadores para baixos”,
disse Kassama, membro do Conselho Federal de Economia.
Valores
O calote, ou default, é quando condições legais de um empréstimo não são quitadas e logo, a pessoa física ou jurídica se torna inadimplente. Desta forma, o calote elevado é um causador de uma economia emperrada no país.
O economista do Serasa, Luiz Rabi, fala sobre os Estados com grandes centros urbanos e mais industrializados estarem em uma situação pior.
No levantamento da pesquisa do Serasa realizada por Rabi, publicado na matéria de Márcia Chiara, é observado que a causa preponderante do Amazonas assumir o terceiro lugar do ranking é por serem muito pobres. O economista do Serasa também falou que o fator do Amazonas ter a Zona Franca de Manaus não significa um movimentador forte nas cadeias produtivas.
A fala de Luiz Rabi para alguns economistas é controvérsia, já que o tema da inadimplência no Estado é motivo para divergências de especialistas na hora da explicação dos principais causadores da sua posição da pesquisa.
A Zona Franca é a principal matriz econômica do Amazonas, o que gera cerca de 100.000 empregos diretos e outros 300 a 400.000 indiretos. A economista Denise Kassama discorda da avaliação de Rabi.
“Todos nós dependemos da Zona Franca, seja fornecendo para ela ou fornecendo para seus trabalhadores e seja através do retorno dos impostos. A arrecadação do ICMS é algo bom, que reverte”.
Denise ressalta que o desemprego no Estado ainda é alto, e que nem todos os empregados são do Polo Industrial de Manaus (PIM), o que deve ser um fator para o número de inadimplentes, mas que a Zona Franca gera sim movimentação na produção do Estado.
“Muitos municípios dependem quase que exclusivamente desse ICMS repassado pelas prefeituras e acabam por gerar emprego lá do interior, mas as atividades produtivas são relativamente baixas por conta da dificuldade de escoamento”,
frisou Denise.