A Superior Corte de Justiça de Londres recebeu na segunda-feira o processo movido por Felipe Massa contra a Federação Internacional do Automobilismo (FIA), a Formula One Management (FOM) e o ex-presidente da categoria, Bernie Ecclestone, pelo resultado do campeonato 2008 da F1. Os autos da ação, que considera o ex-F1 como campeão do ano em questão, detalham como foi baseado o pedido de indenização que pode chegar a R$ 1 bilhão.
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Massa aguardava a resposta de uma carta enviada às entidades em agosto de 2023, necessária para oficializar o processo. E além de uma indenização que pode variar de 64 a 150 milhões de libras, equivalente a R$ 400 milhões até R$ 960 milhões – segundo noticiado pelo blog de Lauro Jardim no “O Globo”, o brasileiro exige que a FIA reconheça o erro na análise do episódio.
– Sempre disse que iria brigar até o final. Como a FIA e a FOM decidiram não fazer nada, buscaremos a correção desta injustiça histórica nos tribunais. O assunto agora está com os advogados e eles estão plenamente autorizados a fazer o que for necessário para que a justiça no esporte seja feita – declarou o ex-F1.
O resultado da temporada vencida pelo britânico Lewis Hamilton é questionado devido ao Singapuragate, como é chamada a batida intencional de Nelson Piquet Jr para favorecer a vitória de seu então colega da Renault, Fernando Alonso. Massa era pole position e líder da corrida, mas sofreu com um erro e uma punição ao fazer seu pit stop sob o safety car e caiu para 13º.
O processo se baseia nas leis britânicas e francesas – nacionalidade da FIA. Detalha o contexto da corrida em Marina Bay e do campeonato em geral, e alega que Nelson Piquet, tricampeão e pai de Nelson Piquet Jr, revelou o episódio ao então diretor de provas da FIA Charlie Whiting ainda no GP do Brasil de 2008, no fim de semana de 2 de novembro.
Max Mosley (na época presidente da federação) e Ecclestone estavam presentes na etapa, a última do ano e que coroou Hamilton campeão, e teriam sido informados por Whiting.
O trio, diz o documento, estava ciente “até 30 de novembro de 2008 e/ou antes da Cerimônia de Premiação que a batida foi ou, alternativamente e no mínimo, poderia ter sido deliberada”. O registro recorda que Ecclestone “persuadiu” Piquet a não divulgar que o acidente de seu filho foi proposital.
O que faria de Massa campeão – de acordo com o processo?
- O documento considera que, se tivesse agido corretamente, a FIA investigaria a batida antes de 30 de novembro de 2008 ou da cerimônia de premiação, realizada em Mônaco em 11 de dezembro;
- Com a análise em andamento, a FIA poderia adiar a cerimônia de gala que coroou Hamilton campeão e encerrou a possibilidade de recorrer aos resultados;
- A investigação concluiria que a batida foi intencional – assim como ocorreu na análise conduzida pela entidade em 2009, que levou à punição de Flávio Briatore, ex-chefe da Renault, e Pat Symonds, ex-engenheiro chefe;
- Ao considerar que os resultados do GP “foram afetados por fraude ou manipulação deliberada”, a FIA poderia cancelar a corrida ou atribuir pontos refletindo as posições anteriores à batida na 14ª volta. Massa liderava com dez pontos até então, Hamilton era segundo com oito e Kimi Raikkonen, terceiro, detendo seis pontos provisórios;
- Se a corrida fosse invalidada, Hamilton perderia os seis pontos e terminaria o campeonato com 92 pontos contra 97 de Massa, que não pontuou em Marina Bay. Contabilizar o resultado antes da batida também teria Massa pontuando mais que Hamilton, liderando à frente do britânico na prova.
Sem pontuar, Massa perdeu o título para Hamilton por um ponto de diferença: 98 contra 97. O caso só veio a público em 2009, no GP da Hungria. Na época, o regulamento esportivo da F1 só permitia a contestação de resultados até a cerimônia de premiação da FIA, que foi em 11 de dezembro.
No entanto, Ecclestone revelou no começo de 2023 que soube da intencionalidade da batida de Piquet Jr ainda em 2008, o que possibilitaria uma revisão da corrida. O britânico justificou que a F1 e a FIA mantiveram silêncio para proteger a integridade do esporte.
Como foi calculada a indenização?
Os valores estimados para a indenização de Massa de 64 a 150 milhões de libras (R$ 400 milhões até R$ 960 milhões), de acordo com a equipe do piloto, foram calculados por um especialista em casos complexos do gênero, que definiu o piso em 64 milhões de libras sem correção ou juros e esperando por um acréscimo no futuro.
Para isso, foi considerado o bônus de 2 milhões de euros (ou R$ 10 milhões na cotação atual) que Massa receberia da Ferrari pelo título. Levou-se em conta, também, a diferença entre o salário que ele poderia ter negociado como campeão mundial, e o que ele de fato recebeu na escuderia e na Williams até o fim de sua carreira na elite do automobilismo, em 2017.
Isso inclui também outros cargos na F1 e em outras categorias. Por fim, os especialistas contabilizaram as oportunidades de publicidade e patrocínio que o título poderia promover.
A FIA é responsabilizada por não investigar o incidente assim que soube ou em qualquer momento antes da cerimônia de premiação; permitir a consolidação dos resultados apesar da irregularidade da prova, e ocultar do público que Piquet havia informado a entidade sobre o caso, ainda em Interlagos.
Ecclestone e a FOM também são acusados de “deliberadamente desconsiderar” o próprio regulamento da F1 e induzir sua violação. Ele e Mosley, diz os autos, “concordaram em usar meios legais com a intenção de causar danos” a Massa.
Em 2023, os advogados de Massa chegaram a enviar “preservation notices” para Ferrari, Renault (hoje chamada Alpine), a patrocinadora ING e os ex-gestores da Renault Flavio Briatore, Pat Symonds e Steve Nielsen, envolvidos no caso.
O pedido solicita, formalmente, a adoção de esforços das partes convocadas para evitar a destruição ou modificação de documentos ligados ao caso que podem servir como provas.
Massa recebeu, recentemente, apoio do amigo e ex-chefe da Ferrari, Jean Todt. Também ex-presidente da FIA entre 2009 e 2021, o francês defendeu o cancelamento do GP de Singapura de 2008, e ainda admitiu que a equipe poderia ter adotado outra postura na época.
Seis vezes campeão de construtores com Michael Schumacher, Todt chefiou a Ferrari de 1994 a 2007, um ano antes do escândalo. Na época da polêmica, porém, ele foi substituído como chefe por Stefano Domenicali, hoje presidente da F1, e já havia assumido a função de consultor especial até 2009.