A vitória da venezuelana María Corina Machado do Prêmio Nobel da Paz repercute nos corredores dos Palácios do Planalto e do Itamaraty com certa decepção.
Fontes governo ouvidas avaliam que a escolha pela opositora de Nicolás Maduro foi “fraca” devido ao que chamam de “um histórico complicado”. Argumentam que ela apoiou o golpe contra o ex-presidente Hugo Chávez, em 2002.
Integrantes do governo Lula criticam o comportamento de Corina de ir ao exterior buscar apoio para derrubar o regime Maduro, flertando com a intervenção externa em seu país.
Também comparam sua atuação com o papel desempenhado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), de trabalhar junto ao governo dos Estados Unidos por sanções contra autoridades brasileiras a fim de influenciar a situação jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
María Corina é acusada pelo chavismo de apoiar o golpe de 2002 por ter assinado a ata de constituição do presidente interino Pedro Carmona, após o golpe contra Chávez, o que ela nega.
A líder opositora apoiou sanções contra a Venezuela em 2017, momento de grave crise econômica e escassez no país, por acreditar que eram o caminho para tirar o chavismo do poder, e tem apoiado as medidas de Donald Trump, que acusou Maduro de liderar um cartel e militarizou o mar do Caribe.
Mas, para o governo Lula, a escolha não chegou a ser uma surpresa, já que há certa tradição em premiar pessoas que fazem resistência a ditadores A avaliação, no entanto, é que a escolha do comitê noruego conseguiu desagradar tanto o Palácio de Miraflores quanto a Casa Branca.
Uma preocupação de uma das fontes ouvidas pela reportagem é a de que a láurea concedida a María Corina fortalece a posição “intervencionista” do secretário do Departamento de Estado americano, Marco Rubio, nas disputas internas da gestão de Donald Trump.
Rubio, quando ainda era senador, indicou o nome de Corina em 2024. Linha dura com o regime de Maduro, a postura do secretário de Estado tem se imposto sobre de Richard Grenell, enviado presidencial especial para missões especiais de Trump, que esteve recentemente na Venezuela e negociava diretamente com Maduro.
Na avaliação de um auxiliar de Lula, o Nobel da Paz para a líder opositora pode “enfraquecer” a ala dialoguista do governo Trump liderada por Grenell.
O assessor internacional da Presidência da República, Celso Amorim, se manifestou sobre a premiação. Em declaração à imprensa, ele disse que entendia que o Nobel priorizou a política ao invés da paz ao premiar María Corina Machado.
“Não sei os critérios do Nobel. Nem ponho em dúvida as qualidades pessoais da María Corina”, afirmou.
A resistência do governo Lula em relação a María Corina não é de hoje. Em entrevista dois dias antes das eleições do ano passado, ela afirmou que o presidente brasileiro foi “muito duro com a relação à defesa” que fez do seu direito de ser candidata.
“Acho que em um momento ele foi muito duro com a relação à defesa que eu fiz do meu direito de ser candidata, tendo tido mais de 90% de apoio nas primárias, e tendo sido objeto de uma perseguição ilegal, brutal e injusta por parte do regime. E uma inabilitação totalmente inconstitucional”, afirmou.
Meses antes, ela respondeu a Lula sobre a crítica de “ficar chorando” ao invés de indicar outro candidato em seu lugar, como o brasileiro fez com Fernando Haddad nas eleições de 2018.
“Eu chorando, presidente Lula? O senhor diz porque sou mulher? O senhor não me conhece. Estou lutando para fazer valer o direito de milhões de venezuelanos que votaram por mim nas primárias e os milhões que têm direito de votar em umas eleições presidenciais livres nas quais derrotarei o Maduro”, escreveu Machado na rede social X.
À imprensa internacional, ela afirmou acreditar, no entanto, que o presidente havia mudado sua percepção em relação a ela, ao exigir que Maduro reconhecesse os resultados do pleito presidencial do ano passado.