Após 13 anos de guerra civil, que deixou mais de 500 mil mortos, forças rebeldes entraram na capital da Síria e reivindicaram o controle do país no domingo (8).
O ditador Bashar al-Assad, que comandava o país desde 2000, fugiu com a família para a Rússia, uma de suas duas principais aliadas, onde obteve asilo humanitário.
Ao longo do dia, milhares de pessoas saíram às ruas de Damasco para celebrar. Capitais europeias também registraram comemorações de refugiados sírios. Mas a pergunta sobre o futuro do país ficou no ar. Afinal, quem governará a Síria agora?
“Hoje (domingo) estamos celebrando, mas amanhã (segunda-feira) começaremos o trabalho duro”, disse Hind Kabawat, professora síria do Centro para Religiões, Diplomacia e Resolução de Conflitos da universidade George Mason, à rede de TV Al-Jazeera.
“Temos que trabalhar juntos para construir um governo democrático. Essa transição só pode ser feita e decidida pelos sírios, mas precisamos do apoio de todo o mundo”.
Os rebeldes que reivindicam vitória pertencem ao HTS, um grupo sunita que teve origem na Al-Qaeda e que, assim como ela, é considerada pelos Estados Unidos e outros países como uma organização terrorista.
Depois, em um discurso feito em uma mesquita em Damasco e sob aplausos de uma plateia formada em maioria esmagadora de homens, o líder do HTS, Mohammed al-Golani, chamou a conquista de “uma vitória para a nação islâmica”.
Al-Goni disse, entretanto, que protegerá as minorias — o HTS é um grupo sunita e religioso, e há o temor de que um eventual governo dos rebeldes resulte em restrições a mulheres e perseguição a fiéis de outras religiões.
O líder do HTS, entretanto, não deixou claro como será o novo governo. Não explicou, por exemplo, se o grupo vai tentar governar sozinho ou se buscará uma composição com outros grupos rebeldes e demais opositores do regime Assad. Não disse nada, tampouco, sobre eleições.
Em uma manifestação por escrito horas antes, al-Golani disse que o atual premiê da Síria, Mohammed Ghazi al-Jalali, iria continuar à frente do governo até que fosse feita a transição para o novo regime.
Fragmentação da Síria é desafio
Um grande desafio é a grande fragmentação da a Síria e da oposição a Assad.
Mesmo ainda sob o regime de Bashar al-Assad, cada região do país era controlada por um grupo diferente: as tropas de Assad conseguiam governar a região central e a costa mediterrânea, enquanto o controle das outras regiões eram divididos por grupos rebeldes que não são necessariamente aliados.
Existem, ainda, diversos grupos políticos de oposição a Assad que estão exilados no exterior e podem querer voltar ao país e reivindicar participação do poder.
Comunidade internacional comemora e vê risco
Também ainda é uma incógnita como a comunidade internacional vai ser relacionar com o HTS. Mohammed al-Golani, por exemplo, é procurado pelos Estados Unidos, que oferecem US$ 10 milhões por informações que possam levar à sua prisão.
Em manifestação após a tomada do poder pelos rebeldes, o presidente dos EUA, Joe Biden, comemorou o fim do regime, mas expressou cautela.
“Até que enfim, o regime de Assad acabou”, afirmou Biden, para complementar: “Este é um momento de riscos e incertezas. Os EUA trabalharão com parceiros e interessados para ajudá-los a aproveitar esta oportunidade.”
Mais cedo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, havia dito algo semelhante:
“A ditadura cruel de Assad caiu. Essa mudança histórica na região oferece oportunidades, mas não sem riscos.”
Haid Haid, consultor do instituto de relações internacionais Chatham House, vai no mesmo sentido.
“Pela primeira vez, há a possibilidade de que o que pode vir a seguir possa ser melhor do que hoje. Com certeza, há o risco de que possa ser pior. Mas, pela primeira vez, há mais de uma possibilidade”, disse Haid à agência de notícias Reuters.