A decisão do rei Charles de expulsar seu irmão Andrew da monarquia e retirá-lo da mansão de 30 cômodos onde viveu por mais de 20 anos foi tão repentina quanto dramática.
É a humilhação definitiva para o agora ex-príncipe de 65 anos, conhecido por apreciar os privilégios e regalias da vida real. Ele deixará a Royal Lodge, sua mansão suntuosa no coração da propriedade de Windsor nos arredores de Londres, e será exilado para o interior para viver no anonimato.
A monarquia estava sob intensa pressão para resolver a questão de Andrew em meio à renovada fúria pública sobre seus laços com o falecido criminoso sexual Jeffrey Epstein, situação ainda mais agravada pela publicação das memórias póstumas de Virginia Giuffre, que o acusou de abuso sexual. Andrew negou repetidamente as alegações contra ele.
Há duas semanas, Andrew abriu mão do uso de seus títulos e honrarias, mais de cinco anos após se afastar das funções reais oficiais. Ele disse que estava colocando “o dever com minha família e país em primeiro lugar”, mas isso pouco fez para conter o escândalo crescente.
Na noite de quinta-feira (30), veio o anúncio bombástico e direto do Palácio de Buckingham: Andrew perderia seu status de príncipe e, com efeito imediato, se tornaria simplesmente Andrew Mountbatten-Windsor, um cidadão comum.
O comunicado do palácio foi claro – a decisão foi do rei e Andrew não teve escolha no assunto (embora se entenda que ele não tenha se oposto às ações de seu irmão). Notável também no comunicado foi uma expressão de solidariedade com as vítimas de abuso.
A importância das ações de Charles na quinta-feira (30) não pode ser subestimada. Desde a crise da abdicação de 1936, não havia ocorrido um afastamento tão público de um membro sênior da realeza britânica.
A decisão certamente foi difícil – e, considerando a dinâmica familiar envolvida, profundamente pessoal. Mas o monarca não teve escolha – as controvérsias de Andrew têm perseguido a família por anos e a publicação das memórias póstumas de sua acusadora foi a gota d’água. As negociações para chegar a este ponto devem ter sido desafiadoras, mas o monarca não teve outra opção senão entrar em modo de controle de danos.
Não foi apenas o público que expressou indignação e frustração; também havia crescentes apelos para que Andrew comparecesse perante uma comissão parlamentar.
Talvez esta medida evite essa particular indignidade.
A historiadora real Kate Williams afirmou que a decisão do rei foi “sem precedentes”.
“Esta é uma mudança extraordinária por parte da família real. Recentemente, o rei anunciou que Andrew estava se afastando do título de Duque de York apenas alguns dias antes da publicação das memórias da Sra. Giuffre. Mas isso simplesmente não foi suficiente para a opinião pública”, disse ela.
“Já tivemos pessoas no passado perdendo o título de príncipe ou princesa. Henrique VIII (que reinou de 1509 a 1547) declarou que suas filhas não eram mais legítimas após anular os casamentos com suas mães, Catarina de Aragão e Ana Bolena – mas ele mudou de ideia posteriormente.”
Ela também mencionou o príncipe Charles Edward – um dos netos da rainha Vitória – cujo título de Duque de Albany foi removido pelo parlamento em 1917 após lutar pela Alemanha na Primeira Guerra Mundial. Mas a situação de Andrew, segundo Williams, era diferente, pois ele foi censurado devido a seus graves erros de julgamento.
As medidas do rei foram bem recebidas por muitos políticos britânicos. A líder conservadora Kemi Badenoch afirmou que “o rei claramente sentiu que esta é a decisão correta para a família real”, mas acrescentou que “deve ter sido algo muito difícil” agir contra seu próprio irmão.
O líder dos Liberais Democratas centristas disse que a situação de Andrew “havia se tornado totalmente insustentável, tendo desonrado seu cargo e envergonhado o país.”
Ele acrescentou: “Este é um passo importante para reconstruir a confiança em nossas instituições e encerrar este triste capítulo.”
Por várias semanas, havia a sensação de que algum tipo de anúncio estava por vir, sendo apenas uma questão de quando, não de se aconteceria.
Fontes reais informaram à imprensa que o rei estava tentando agir rapidamente após os desenvolvimentos recentes, mas precisava de algum tempo para consultar especialistas jurídicos e constitucionais.
Também se entende que o rei tomou medidas considerando os sérios lapsos de julgamento de seu irmão e conta com o apoio da família mais ampla, incluindo o príncipe William.
O comunicado, quando veio, foi inflexível.
“Essas censuras são consideradas necessárias, apesar do fato de que ele continua negando as alegações contra ele”, afirmou o comunicado.
Para muitas pessoas no país, e certamente para os críticos da família real, essas medidas podem não ser suficientes para reabilitar a reputação manchada da monarquia. Para alguns, a remoção do status de príncipe de Andrew é apenas um primeiro passo. Outros críticos afirmam que a família protegeu Andrew ao longo dos anos, e que a pressão por algum tipo de responsabilização precisa continuar.
“Perder títulos insignificantes não é uma resposta para acusações muito sérias de crimes sexuais e corrupção em cargo público”, declarou Graham Smith, diretor executivo do grupo Republic, que faz campanha contra a monarquia, após o anúncio do palácio.
“Isso não é sobre William e Charles adotarem uma postura firme. É sobre William e Charles protegerem suas posições, criando o máximo de distância possível entre eles e Andrew”, acrescentou Smith. “Precisamos ver Andrew enfrentar a justiça, porque precisamos saber que os membros da realeza não estão acima da lei.”
Apesar de ter sido destituído de seu título de príncipe, Andrew permanece em oitavo lugar na linha de sucessão ao trono. Fontes reais informaram à imprensa que ele receberá uma casa na propriedade privada do rei em Sandringham, e também receberá uma renda de Charles.
Sua ex-esposa Sarah Ferguson, que morava com Andrew na Royal Lodge nas últimas duas décadas, também está se mudando e, segundo informações, está fazendo seus próprios arranjos.
Suas duas filhas, as princesas Beatrice e Eugenie, manterão seus títulos como filhas do filho de um soberano, de acordo com uma diretiva emitida pelo rei George V em 1917.
Ainda não está claro se as ações do rei serão suficientes para criar uma percepção pública de que a situação foi adequadamente tratada, mas Charles parece estar fazendo tudo o que considera possível dentro de suas prerrogativas reais.


