Na semana passada, o economista Samuel Pessoa, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), trouxe ao debate antigas teses liberais em entrevista ao jornal A Crítica, seguindo o pensamento muito conhecido no Continente e que tem levado a expandir a base pobre da pirâmide enquanto favorece a concentração financeira nas mãos da minoria bem-aventurada. Em suas declarações, o economista criticou a Zona Franca de Manaus (ZFM), classificando-a absolutamente como “atividade artificial”. Essa postura – que tem buscado historicamente esvaziar o Polo industrial de Manaus – reflete uma compreensão limitada da realidade amazônica e ignora a complexidade e a importância da ZFM para a economia regional e nacional. Desinformação ou maledicência?
Paraquedismo perverso
O rentismo – o novo modo de produção que só enxerga a lógica financeira da realidade – desconsidera o impacto significativo da ZFM, que representa cerca de 30% da atividade econômica de toda a região Norte. Seus profetas estigmatizam o Polo Industrial de Manaus (PIM) como uma atividade artificial, ignorando que empresas como a Moto Honda atingem um índice de verticalização industrial próximo a 100%. E crescem nas indústrias a busca intensa pelos suprimentos e componentes regionais. Essa visão reducionista enxerga a Amazônia apenas como um recurso a ser explorado, não tratado sustentavelmente desconsiderando a história de injustiça e exploração da região pelo governo central.
Um programa de sucesso, não de fracasso
Contrariando as alegações de praxe, a ZFM não é uma distorção artificial, mas uma estratégia de desenvolvimento regional que tem promovido a preservação ambiental e a geração de 500 mil empregos. Que outra atividade o rentismo pode sugerir para suprir essa demanda essencial de emprego e renda? A proposta de buscar um substituto para a Zona Franca ignora os avanços econômicos e sociais que essa iniciativa trouxe para o Amazonas. Os argumentos se baseiam na precariedade da infraestrutura logística do país para satanizar a ZFM, mas oferece pouca ou nenhuma alternativa viável.
Falta compromisso e sobra desconhecimento
Chega de achismos que ignoram os avanços e não se dispõem ao diálogo, à proposição de alternativas que reduzam o abismo entre o Norte e o Sul do país. preferindo repetir argumentos que refletem um profundo desconhecimento da realidade regional. O economista ignora estudos, como o de seus colegas da Fundação Getúlio Vargas que investigaram os impactos, a efetividade e as oportunidades geradas pela ZFM, demonstrando que ela é, na verdade, um modelo de sucesso a ser replicado, e não eliminado.
A quem Interesse eliminar a ZFM?
Baseados num power-point da Receita Federal sobre seus gastos fiscais, os desafetos pregam que o Amazonas representa uma renúncia fiscal que prejudica o país. Ignoram outro dado, este sim baseado nos próprios indicadores da Receita que coloca o Amazonas entre os oito estados que sustentam a arrecadação, ou seja, ajudam a levar o país em frente. Dizer que “ a renúncia fiscal do Amazonas” prejudica o país é premissa é falaciosa. Antes da criação da ZFM, não havia receita tributária significativa na região. Sem receita pré-existente, não há renúncia a ser contabilizada. As empresas que aceitam o convite do poder público não contam com qualquer suporte financeiro público. Tudo corre por conta e risco do investidor.
Economia não pode ignorar Historia
Isso aprendemos nas primeiras aulas da graduação. É vedado a um economista que presta serviços na Amazônia ignorar o fato de que a decisão de implementar a Zona Franca – além de ser uma política do Estado brasileiro, não de governos – foi uma medida política para integrar a Amazônia ao resto do Brasil e evitar sua entrega à cobiça estrangeira. Desde então, o país tem usufruído principalmente dos bônus, os frutos do programa ZFM, sem a contrapartida do ônus, ou seja, investir significativamente na infraestrutura competitiva da região.
Desenvolvimento regional e perspectiva nacional
A criação do modelo ZFM foi uma estratégia para fomentar o desenvolvimento na Amazônia, uma região historicamente negligenciada. Criticar a ZFM sem considerar o contexto mais amplo da economia nacional e das políticas de desenvolvimento regional é injusto e extemporâneo. Graças à ZFM, o Amazonas tem conseguido manter a floresta em pé e gerar desenvolvimento sustentável, beneficiando não apenas a região, mas o país e o clima como um todo.
Procuram-se economistas comprometidos
O Brasil precisa de economistas que entendam o Brasil e suas particularidades de desenvolvimento regional e que não vejam a Amazônia apenas como um obstáculo ou uma anomalia econômica. As palavras de profissionais desavisados refletem uma postura surda e visão opaca às necessidades da região e perpetuam as desigualdades entre o Norte e o Sul do país. O debate sobre o futuro da Zona Franca de Manaus deve ser conduzido com base em fatos, conhecimento profundo da realidade local e um compromisso com o desenvolvimento sustentável e inclusivo. O Brasil não precisa de economistas do rentismo, eles só pensam naquilo. O país precisa de quem tenha compromisso em integrar suas regiões e desenvolvê-las com civismo, justiça e dignidade.
Nelson é economista, empresário, presidente do Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, SIMMMEM, conselheiro do CIEAM e vice presidente da FIEAM.