No dia 04/06/2021 iniciou-se a segunda década da Lei Complementar n. 135/2010, a Lei da “Ficha Limpa”, fruto de uma proposta apoiada por 1,7 milhão de assinaturas de eleitores e eleitoras, conforme consta no Relatório do Senador Demóstenes Torres, então Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
É imperioso retroceder ao não menos importante ano de 1988, o da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil. Em seu art. 14, § 9º, dispôs que “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Em cumprimento à norma constitucional foi decretada e sancionada a LC 64/90 que regulamentou a matéria de inelegibilidades no ordenamento jurídico. Logo depois, em 1994, o dispositivo da Constituição foi alterado pela Emenda Constitucional de Revisão nº 04 que passou à vigente redação que diz “ Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”. A alteração foi discreta, mas de grande importância.
Ampliou o rol de valores protegidos pela norma e que são considerados fundamentais para o exercício de mandato eletivo: a probidade administrativa, a moralidade e a vida pregressa. Iniciou-se, então, amplo debate sobre o alcance da norma e sua autoaplicabilidade. Apenas 16 anos depois, em 2010, veio a resposta. Em breve resumo ela trata de 14 causas de inelegibilidades. Estabelece como marco inicial da inelegibilidade a decisão colegiada que a declarou, sem a exigência de definitividade do julgamento, o que acabava arrastando a questão por anos em face dos inúmeros recursos interpostos pelos “ficha suja”. De todas as alterações, a mais dura foi o aumento do prazo de inelegibilidade que passou de 03 para 08 anos.
Embora decretada e promulgada em 2010, ela só foi aplicada para o pleito de 2012, em razão do art. 16 da Constituição segundo o qual “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. A lei sofreu inúmeros questionamentos no âmbito do Supremo Tribunal Federal, onde se destacam as ADCs nº 29 e nº 30 e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4578. Em todas a Excelsa Corte decidiu pela constitucionalidade da Lei, inclusive fixando que as disposições nela contidas alcançariam os atos e fatos ocorridos antes de sua vigência.
Recentemente, a Lei voltou ao radar com a decisão do Min. Nunes Marques em sede liminar nos autos da ADI 6630, onde restou deferido o “pedido de suspensão da expressão ‘após o cumprimento da pena’, contida na alínea ‘e’ do inciso I do art. 1º da Lei Complementar 64/1990, nos termos em que fora ela alterada pela Lei Complementar 135/2010, tão somente aos processos de registro de candidatura das eleições de 2020 ainda pendentes de apreciação, inclusive no âmbito do TSE e do STF”. A decisão acolheu o argumento do autor da ação, o Partido Democrático Trabalhista – PDT, de que a norma “estaria a acarretar uma inelegibilidade por tempo indeterminado, a depender do tempo de tramitação processual” sem considerar a denominada “detração” que é o prazo transcorrido desde a condenação. Muitos pedidos de aplicação imediata da decisão aos processos em trâmite na Justiça Eleitoral, tendo o Presidente do TSE, Min. Luís Roberto Barroso, decidido suspender a tramitação dos processos até uma manifestação do Plenário do STF. Manteve, assim, a inelegibilidade dos candidatos o que impede a diplomação e posse dos eleitos.