Com a intensificação do chamado inverno amazônico, Manaus tem sido castigada pelas chuvas torrenciais, causando alagamentos, transtornos no trânsito e prejuízos para moradores de diversas zonas da cidade. Como acontece todos os anos, nesse período a cidade enfrenta um problema crônico que insiste em se repetir: a falta da cultura da manutenção. Enquanto não encararmos a conservação da cidade como uma necessidade permanente, continuaremos reféns de emergências previsíveis.
A infraestrutura urbana precisa ser tratada como um organismo vivo. Sistemas de drenagem, ruas, pontes, redes de esgoto e abastecimento de água exigem cuidados constantes. Mas a cultura da manutenção tem um grande problema. Trata-se de uma ação que não aparece politicamente. Diferente de uma grande obra, que rende inauguração e visibilidade, a manutenção do que já existe, muitas vezes passa despercebida. No entanto, quando não é feita, os transtornos falam mais alto e neutralizam qualquer ação política ou obra que “aparece” aos olhos da população.
A equação é simples. Se os bueiros e galerias não passam por limpezas regulares e a população continua descartando lixo nas ruas, a água das chuvas não tem para onde escoar. E, como em um ciclo vicioso, a cada chuva forte voltamos a discutir os mesmos problemas, sem atacar a raiz da questão.
O Governo do Amazonas, por meio do Programa Social e Ambiental de Manaus e Interior (Prosamin+), tem feito intervenções fundamentais em áreas vulneráveis da cidade, com reassentamento de famílias que vivem em palafitas e melhorias na infraestrutura urbana. O programa já transformou a vida de milhares de pessoas ao proporcionar habitação digna e saneamento básico, além de reduzir alagamentos em regiões antes críticas. Mas é preciso reforçar que o Prosamin+ atua em áreas específicas, e o enfrentamento do problema na cidade como um todo demanda um esforço coletivo e contínuo.
Outro programa importante nessa frente é o Amazonas Meu Lar, que está diminuindo o déficit habitacional e garantindo moradia digna para milhares de famílias amazonenses. Com investimentos robustos, o programa busca oferecer alternativas para que as pessoas não precisem ocupar áreas de risco, reduzindo a vulnerabilidade social e os impactos ambientais causados pela urbanização desordenada.
A Prefeitura tem um papel essencial na manutenção da infraestrutura urbana, mas a sociedade também precisa fazer a sua parte. Além das limpezas regulares e da fiscalização, campanhas permanentes de conscientização são fundamentais para que os cidadãos entendam o impacto direto do descarte irregular de resíduos no funcionamento do sistema de drenagem. Não basta limpar os bueiros hoje, se amanhã estiverem novamente entupidos de garrafas PET, sacolas plásticas e outros detritos.
A solução passa por um pacto coletivo. O poder público precisa manter a cidade com ações preventivas, e a população deve compreender que jogar lixo na rua contribui diretamente para os alagamentos que tantos prejuízos causam. E mais do que isso: a ocupação desordenada precisa ser enfrentada com programas de habitação social aliados à desocupação gradual e responsável de locais que oferecem risco iminente.
Não podemos continuar aceitando que todo ano a cidade pare quando as chuvas chegam. Precisamos transformar a cultura do remendo, na cultura da manutenção. Isso significa entender que prevenção custa menos do que o prejuízo de uma enchente, que lixo no chão não desaparece, e que cuidar da cidade é uma responsabilidade compartilhada. A solução está ao nosso alcance – basta que cada um faça a sua parte.
Marcellus Campêlo é engenheiro civil, especialista em Saneamento Básico e em Governança e Inovação Pública; exerce, atualmente, os cargos de secretário de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano – Sedurb e da Unidade Gestora de Projetos Especiais – UGPE