Fontes diplomáticas demonstram preocupação com a relação entre o governo Lula e o governo Trump. Desde a eleição do republicano, praticamente não houve nenhum contato entre as partes, além de mensagens protocolares.
Segundo fontes do governo, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, enviou uma carta à sua contraparte americana, Marco Rubio, indicado para o Departamento de Estado dos Estados Unidos, para cumprimentá-lo pela nomeação.
Além da carta, que é uma formalidade, não houve uma tentativa de ligação ao novo Secretário de Estado. Interlocutores próximos ao chanceler brasileiro justificam que a ausência de comunicação acontece porque Rubio tem mantido um perfil discreto enquanto não é oficializado no cargo pelo Senado americano.
Mas alguns diplomatas estão apreensivos com o distanciamento entre os dois governos e afirmam que a relação é fria, na melhor das hipóteses.
Lula declarou apoio à vice-presidente Kamala Harris durante as eleições americanas em 2024. A dois meses da votação, o presidente brasileiro afirmou: “Deus queira que a Kamala ganhe eleição nos EUA”. Na semana do pleito, Lula acrescentou que torcia pela democrata.
Já o ex-presidente Jair Bolsonaro, que defendeu o voto em Trump, foi convidado para a posse do republicano, mas foi impedido de comparecer porque seu passaporte foi retido por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi representado por sua esposa, Michelle.
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Ainda que não seja praxe nos Estados Unidos que os chefes de Estado sejam convidados à cerimônia de posse, Trump quebrou a tradição e convidou líderes como o presidente chinês Xi Jinping e aliados da ultradireita, como Javier Milei, da Argentina e Giorgia Meloni, primeira-ministra da Itália.
Fontes próximas ao chanceler Mauro Vieira minimizam a situação e dizem que convites a países como Argentina e China, desta vez, são exceções que confirmam a regra.
A percepção dentre os diplomatas é que a indiferença de Trump com Lula era previsível, já que o governo que está entrando nos Estados Unidos tem lado – e não é o de Lula.
Vitelio Brustolin, professor de relações internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador de Harvard, avalia que o Itamaraty tem seguido o protocolo de forma técnica para lidar com a transição de poder nos Estados Unidos, mas pondera que cumprir estritamente o direito internacional não significa que a relação entre os países seja boa.
“Apesar de todos os erros da política externa do governo Bolsonaro, quando Trump ameaçou tarifar o Brasil, Bolsonaro falou com Trump para evitar a medida. Lula poderia ter colocado uma pedra sobre isso, mas não o fez. Essa postura prejudica o Brasil. Do ponto de vista político, ele não deveria ter declarado apoio a ninguém. Essa diplomacia presidencial mais atrapalha do que aproxima”, afirma Brustolin.
O professor observa que apesar de não ser praxe o convite de presidentes à posse americana, Trump quebrou protocolos e presidentes da América do Sul, como Javier Milei, estarão presentes na cerimônia, além de Bolsonaro ter sido convidado.
“Os Estados Unidos são o nosso segundo maior parceiro comercial, só atrás da China. Não tem como o Brasil se beneficiar dessa situação. A diplomacia é feita por gestos, tem uma linguagem própria, que vai além dos atos puramente protocolares”, diz Brustolin.
“A forma como Lula e Trump se relacionam tem reflexos sobre ambos os países. Não se trata de uma relação pessoal, mas sim de dois servidores públicos que atuam, ou deveriam atuar, em prol do interesse público de seus países”, completa.