Brasília – O presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Não-Governamentais (ONGs), senador Plínio Valério (PSDB-AM), afirmou ter provas sobre irregularidades na prestação de contas da Fundação Amazônia Sustentável (FAS).
Instalada em 14 de junho, a CPI das ONGs tem o objetivo de investigar as atividades destas instituições financiadas com dinheiro público, na região da Amazônia. A CPI tem 11 membros titulares e sete suplentes. Ela atua por 130 dias (pouco mais de seis meses) e terá um limite de R$ 200 mil em despesas.
A fala do presidente da comissão aconteceu durante o depoimento do superintendente geral da FAS, Virgílio Viana, na última terça-feira (12). Ele foi convocado pelo senador Plínio Valério para prestar esclarecimentos acerca da quantidade de recursos públicos, investidos na fundação, que foram destinados à população da região.
Viana afirmou que, em 15 anos de atuação, a FAS conseguiu captar cerca de R$ 400 milhões junto a empresas e o poder público. Do total, 77% teriam sido usados diretamente em projetos de sustentabilidade econômica na Amazônia, enquanto 23% teriam sido usados em outras atividades, como gestão e operação da fundação.
O responsável pela FAS informou ainda que 79% dos R$ 400 milhões vieram da iniciativa privada e 85%, de fonte brasileira. Segundo o superintendente, a atuação beneficia diretamente cerca de 60 mil pessoas na região, na capacitação e em investimentos, por exemplo, nas cadeias microeconômicas ligadas à produção de açaí, banana, farinha e na pesca do pirarucu, dentre outras cadeias.
“A FAS continua em seu propósito de assegurar a conservação e o desenvolvimento sustentável na Amazônia, demonstrando que o equilíbrio entre recursos privados e públicos, nacionais e internacionais, é fundamental para alcançar um futuro sustentável para essa região tão vital para o nosso planeta”, disse a fundação.
Contrapontos
Segundo a Agência Senado, a maioria dos parlamentares que integram a CPI das ONGs fizeram contrapontos às falas do convidado e questionam que a FAS possa ter produzido bons resultados. Plínio Valério, por exemplo, disse ter relatórios que contestam a prestação de contas da fundação.
“O índio não precisa de tutela, tem que dar liberdade para que, com o fruto do seu trabalho, possa sustentar sua família. Aí têm ONGs que não permitem turismo, estrada, porque não faz parte da cultura. Se a ONG fizer um bom trabalho, índio não precisa de tutela. Deixa ele só que ele vai fazendo. Não tive resposta sobre quanto se gastou para chegar ‘na ponta’. Fazer é fácil se tiver dinheiro, resta saber o que foi feito com tanto dinheiro, porque para a pobreza do povo do Amazonas, R$ 400 milhões é muito dinheiro”, disse o senador.
Styvenson Valentim (Podemos-RN), por sua vez, destacou não considerar ético que a própria FAS contrate a empresa de auditoria que fiscaliza a prestação de contas, que só depois é enviada aos órgãos de controle. O senador potiguar também lamentou que o semiárido nordestino não desperte a atenção do “mercado das ONGs”, considerando os baixos índices de desenvolvimento humano (IDH) que marcam a região.
Para os dois senadores, as ONGs preferem a Amazônia porque é muito rica em minérios e outros recursos naturais, o que atrairia os financiamentos milionários para a atuação delas.
Crítica a protestos contra exploração ambiental
O relator da CPI das ONGs, Márcio Bittar (União-AC), criticou as organizações por entrarem na Justiça frequentemente “contra a construção de hidrelétricas, estradas, obras de infraestrutura em geral, e a exploração petrolífera, de gás e minérios na Amazônia”, diz a Agência Senado. Bittar acrescentou que o atraso na infraestrutura impacta diretamente a arrecadação do poder público que atua na região.
O relator também argumentou que Noruega, Alemanha, EUA e Canadá não financiam obras de infraestrutura na Amazônia e priorizam financiamentos bilionários ao Fundo Amazônia ou diretamente para as ONGs. Bittar afirma que a Noruega já doou R$ 1 bilhão ao Fundo Amazônia, mas a Hydro, mineradora norueguesa que atua na Amazônia e tem o governo norueguês como acionista, já teria se beneficiado com R$ 6,5 bilhões em isenções fiscais no Brasil.
“Esses investimentos nas ONGs, inclusive através do Fundo Amazônia, não trazem independência econômica aos amazônidas. O que pode propiciar isso são investimentos em infraestrutura, em estradas, pontes e na nossa riqueza mineral, por exemplo. Os amazônidas empobreceram nas últimas décadas porque, por mais, que haja boas intenções, abordagens como as do Fundo Amazônia ou das ONGs jamais terão escala numa região tão gigantesca e com mais de 25 milhões de habitantes”, protestou Bittar.
Fundo Amazônia
Criado em 2008, o Fundo Amazônia deve financiar ações para reduzir o desmatamento e a degradação florestal. Ao todo, já foram financiados 102 projetos, sendo 60 já concluídos, com R$ 1,51 bilhão desembolsado.
O Fundo Amazônia já recebeu R$ 3,396 bilhões em doações, desde 2008. Desse total, 93% foram doados pelo governo da Noruega (R$ 3,189 bilhões), 5,7% pelo governo da Alemanha (R$ 192 milhões) e 0,5% pela Petrobras (R$ 17 milhões).
No final do mês de agosto, o governo da Dinamarca indicou a intenção de doar R$ 110 milhões para o Fundo, de 2024 a 2026 e entrar no grupo de investidores. Porém, as verbas ainda precisam ser aprovadas pelo parlamento dinamarquês.
Em declaração conjunta com o governo dinamarquês, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) informou que o dinheiro deve ajudar a “financiar projetos e iniciativas que contribuam para a redução do desmatamento, a proteção da biodiversidade, a melhoria das condições de vida das comunidades locais e a promoção do desenvolvimento sustentável no Brasil”.
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