Na edição anterior, foi abordado alguns impactos do consumo excessivo de álcool no organismo, e suas consequências no fígado, sistema digestivo e sistema cardiovascular. Nesta continuação, exploraremos como o álcool afeta o sistema nervoso central, o sistema imunológico e a nutrição, além de trazer respostas a outras questões importantes sobre os riscos associados ao consumo.
Vanguarda do Norte: De que forma o consumo excessivo de álcool afeta o sistema imunológico e quais são as consequências para a saúde?
Dr. Amaral: O consumo de álcool prejudica significativamente o sistema imunológico, enfraquecendo as defesas naturais do organismo e aumentando a vulnerabilidade a infecções e doenças. Este impacto no sistema imunológico ocorre tanto no curto quanto no longo prazo, afetando a produção e o funcionamento de células essenciais no combate a vírus, bactérias e outros agentes patogênicos.
Impactos no funcionamento do sistema imunológico:
Redução da produção de glóbulos brancos: O álcool diminui a produção de leucócitos, células que desempenham um papel central na defesa do organismo contra infecções. Essa redução compromete a capacidade do corpo de responder a ameaças ao organismo, deixando o indivíduo mais suscetível a doenças como gripes, resfriados e infecções bacterianas.
Inflamação crônica: O álcool causa um estado inflamatório no organismo. Isso acontece pelo estimulo de produção de citocinas inflamatórias, que, em grande quantidade, enfraquecem a resposta imune e prejudicam o combate a infecções.
Alterações no intestino: O álcool afeta a mucosa intestinal, permitindo que bactérias e toxinas passem para a corrente sanguínea, o que sobrecarrega o sistema imunológico e aumenta o risco de infecções generalizadas.
Consequências para a saúde a curto prazo: Aumento do risco de infecções respiratórias: Estudos mostram que o consumo excessivo de álcool está associado a uma maior incidência de infecções como pneumonia, bronquite e tuberculose. O álcool prejudica o funcionamento dos cílios respiratórios, que são responsáveis por eliminar partículas nocivas das vias aéreas, facilitando a entrada de agentes patógenos nos pulmões.
Complicações pós-cirúrgicas: Indivíduos que consomem álcool têm maior probabilidade de sofrer complicações infecciosas após cirurgias, devido à menor capacidade de cicatrização e à resposta imunológica prejudicada.
Cicatrização mais lenta: O álcool interfere na regeneração celular, dificultando a recuperação de ferimentos e aumento do risco de infecções cutâneas.
Consequências para a saúde a longo prazo:
Maior vulnerabilidade a infecções crônicas:
Risco aumentado de sepse: Em casos graves, a imunossupressão causada pelo álcool pode levar à sepse.
Prejuízo na resposta vacinal: O álcool pode diminuir a eficácia de vacinas.
Impacto indireto no sistema imunológico:Desnutrição: diminui absorção de nutrientes essenciais, como vitaminas A, C, D, E e do complexo B, e de minerais como zinco e selênio, fundamentais para a manutenção do sistema imunológico.
Danos ao fígado: O álcool sobrecarrega o fígado, um órgão essencial para a filtração de toxinas e o metabolismo de substâncias prejudiciais.
Maior risco de câncer:
O sistema imunológico enfraquecido pelo álcool tem mais dificuldade em identificar e eliminar células anormais ou cancerígenas.
Ações para fortalecer o sistema imunológico:
Para minimizar os danos ao sistema imunológico causados pelo álcool, é fundamental adotar medidas de prevenção:
Reduzir ou evitar o consumo de álcool, adotar uma dieta equilibrada, praticar exercícios físico, procurar ajuda médica: Para aqueles com dependência de álcool, é crucial procurar tratamento especializado para evitar complicações futuras pois o álcool não apenas prejudica o funcionamento do sistema imunológico, mas também agrava doenças preexistentes e reduz a capacidade do organismo de se proteger contra infecções e outras condições graves.
VDN: Como o consumo excessivo de álcool pode levar à desnutrição e quais são as consequências para a saúde?
Dr. Amaral: O consumo excessivo de álcool está diretamente associado a quadros de desnutrição, porque ele interfere na ingestão, absorção, metabolismo e utilização de nutrientes essenciais pelo organismo. A desnutrição causada pelo alcoolismo pode ser tanto qualitativa (deficiência de nutrientes específicos) quanto quantitativa (ingestão insuficiente de calorias), resultando em impactos graves para a saúde física e mental.
VDN: Como o álcool contribui para a desnutrição?
Dr. Amaral: Diminuição do apetite: O álcool atua como um supressor do apetite, resultando em uma ingestão calórica insuficiente e desequilibrada.
Calorias vazias: Apesar de ser altamente calórico, o álcool não fornece nutrientes essenciais.
Prejuízo na absorção de nutrientes: O álcool danifica a mucosa do trato gastrointestinal, incluindo estômago e intestinos, prejudicando a absorção de nutrientes como vitaminas A, D, E, K, C e do complexo B, além de minerais como cálcio, magnésio, ferro e zinco.
Alteração no Metabolismo: O fígado, que desempenha um papel fundamental no metabolismo de nutrientes, é gravemente afetado pelo consumo crônico de álcool.
Aumento das perdas nutricionais: O álcool acelera a eliminação de nutrientes pelo organismo, como ocorre com a vitamina B1 (tiamina) e o magnésio, eliminados em maior quantidade pela urina em indivíduos alcoolistas.
Mudanças nos hábitos alimentares O alcoolismo muitas vezes está associado a dietas inadequadas, ricas em alimentos processados e pobres em alimentos nutritivos.
VDN: Quais são as consequências da desnutrição associada ao alcoolismo?
Dr. Amaral: Deficiências vitamínicas: Vitamina B1 (tiamina), deficiência grave de tiamina pode levar à Síndrome de Wernicke-Korsakoff, que causa problemas neurológicos graves, como confusão mental, dificuldade de coordenação motora, perda de memória e demência.
Vitamina B12 e ácido fólico: Pode causar anemia megaloblástica, com sintomas como fadiga extrema, falta de ar, fraqueza muscular e alterações neurológicas.
Vitamina D: A falta de vitamina D, agravada pelo alcoolismo, compromete a absorção de cálcio, resultando em ossos fracos, maior risco de fraturas e osteoporose.
Perda de massa muscular: A desnutrição leva ao catabolismo muscular, resultando em perda de força, diminuição da mobilidade e maior risco de quedas e lesões.
Sistema imunológico enfraquecido: A deficiência de nutrientes essenciais, como zinco, selênio e vitaminas A e C, prejudica o sistema imunológico, aumentando a vulnerabilidade a infecções, como pneumonia e tuberculose.
Distúrbios metabólicos: A desnutrição pode levar a alterações metabólicas graves, como hipoglicemia (níveis baixos de glicose no sangue) e cetoacidose alcoólica, condições que podem ser fatais se não tratadas.
Comprometimento do sistema nervoso: Pode agravar danos neurológicos, resultando em neuropatia periférica (formigamento, dormência e dores nos membros), perda de reflexos e dificuldades motoras.
Alterações cutâneas e capilares: A desnutrição causada pelo alcoolismo pode levar a pele seca, descamação, feridas de cicatrização lenta, queda de cabelo e unhas frágeis.
Complicações gastrointestinais: A deficiência de nutrientes associada ao álcool pode agravar quadros como gastrite, úlceras e má absorção intestinal, intensificando o ciclo de desnutrição.
VDN: Como reverter a desnutrição associada ao alcoolismo?
Dr. Amaral: Cessação do consumo de álcool: O primeiro passo é interromper ou reduzir significativamente o consumo de álcool, permitindo que o trato gastrointestinal e o fígado comecem a se recuperar. Para tando deve-se procurar profissionais de saúde para apoio neste momento e para ajuda na Reposição de nutriente com suplementação de vitaminas e minerais, como tiamina, ácido fólico, vitamina D, cálcio e ferro, é essencial para reverter as deficiências nutricionais. Acompanhamento médico e nutricional.
É fundamental o acompanhamento por profissionais de saúde, incluindo médicos, nutricionistas e psicólogos, para tratar a desnutrição e alcoolismo de forma integrada.
VDN: Quais tipos de câncer estão associados ao alcoolismo?
Dr. Amaral: O alcoolismo está relacionado a cânceres de fígado, boca, esôfago, estômago, mama e colorretal, devido à ação do acetaldeído, um metabólito tóxico do álcool.
VDN: O consumo de álcool afeta a saúde óssea?
Dr. Amaral: Sim, o alcoolismo pode causar osteoporose e aumentar o risco de fraturas, especialmente em mulheres.
VDN: Existe um nível seguro para o consumo de álcool?
Dr. Amaral: Segundo a OMS, não há nível seguro para o consumo de álcool. Qualquer quantidade pode trazer riscos, especialmente em indivíduos predispostos.
As recomendações sobre o consumo de álcool variam entre instituições, mas geralmente são baseadas em limites de “baixo risco” para homens e mulheres:
Homens: Até 14 doses por semana, com no máximo 4 doses em um único dia.
Mulheres: Até 7 doses por semana, com no máximo 3 doses em um único dia.
Idosos: Devem consumir ainda menos, devido à menor capacidade do organismo de metabolizar o álcool.
Obs.: Uma dose padrão corresponde a 14 gramas de álcool puro, o que equivale a aproximadamente uma taça de vinho (150 ml), uma lata de cerveja (350 ml) ou 40 ml de destilado.
Embora esses limites sejam considerados de “baixo risco”, é importante lembrar que eles não eliminam os riscos completamente.
VDN: Como tratar o alcoolismo?
Dr. Amaral: O tratamento inclui abordagens médicas, psicológicas e sociais. Terapias cognitivas, grupos de apoio como Alcoólicos Anônimos e, em casos mais graves, medicamentos e internações podem ser necessários.
O consumo excessivo de álcool é um problema, que afeta a saúde física, mental e social. Desde os danos ao sistema nervoso central até a desnutrição e a fragilidade do sistema imunológico, as consequências são gigantescas e muitas vezes irreversíveis. Porém, é importante lembrar que sempre existe a possibilidade de reverter ou minorar os impactos do alcoolismo, com apoio de equipe multidisciplinar de saúde e mudanças no estilo de vida.
A conscientização é a ferramenta mais poderosa na prevenção e tratamento do alcoolismo. Levar informações sobre os riscos associados ao álcool e investir em campanhas educativas ajudam na redução da incidência, protegendo as pessoas, suas famílias e alcançando assim uma sociedade mais saudável.
Se você ou alguém próximo está vivendo dificuldades relacionadas ao álcool, procure ajuda! Reconhecer o problema é o primeiro passo para a recuperação e uma vida equilibrada e saudável.
Dr. Ricardo Amaral Filho (@amaralfilho)
Mestre em Educação e Saúde | Médico de Família e Comunidade | Médico do Esporte.