Dormir bem é muito mais do que “apenas” descansar, se trata de cuidar do corpo e da mente também garantir saúde, longevidade e qualidade de vida. Durante o sono, o organismo realiza uma série de processos vitais, como exemplo da recuperação muscular, fortalecimento do sistema imunológico e consolidação da memória. Descansar profundamente, prepara o corpo e a mente para os desafios do dia seguinte, renovando energia e promovendo equilíbrio.
Apesar de sua importância, o sono reparador é frequentemente negligenciado. Estudos de 2022 mostraram que 65% dos brasileiros sofrem com noites mal dormidas, segundo pesquisa da Sleep Epidemiology. Outra análise mais recente, da Fundação Oswaldo Cruz em 2023, revelou que 72% dos brasileiros enfrentam distúrbios do sono. Esses números alarmantes refletem não apenas impactos na saúde individual, mas trazem também consequências socioeconômicas importantes, como aumento do absenteísmo e do presenteísmo no trabalho. Acidentes de trânsito e no ambiente de trabalho, são frequentemente associados à sonolência e à falta de atenção, consequências graves da privação de sono. A Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) aponta que 40% dos acidentes rodoviários estão relacionados à sonolência ao volante.
O stress tem um papel crucial na deterioração da qualidade do sono,um estudo da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) acompanhou trabalhadores da área de saúde por um ano e demonstrou que o estresse elevado, causado por demandas excessivas, falta de controle e injustiças no trabalho, aumenta significativamente as chances de má qualidade do sono e dores no corpo. Esses fatores nos chamam atenção de como a rotina acelerada e desequilibrada compromete não apenas o sono, mas também a saúde física e mental.
O sono reparador, essencial o funcionamento pleno do organismo, necessita de noites contínuas, profundas e sem interrupções. Tratando-se de um processo indispensável à saúde física, mental e emocional. Crianças e adolescentes, por exemplo, precisam de um sono de qualidade para garantir seu desenvolvimento físico, cognitivo e comportamental, adultos dependem dele para prevenir doenças crônicas e manter a saúde cardiovascular.
Neste artigo, vamos responder perguntas sobre a importância do sono para a saúde, as funções vitais realizadas durante o descanso e os impactos diretos de noites mal dormidas. Também daremos dicas práticas para ajudá-lo a melhorar sua rotina de descanso e garantir noites reparadoras.
VDN: Quantas horas de sono são recomendadas para cada faixa etária?
Dr. Amaral: A quantidade ideal de horas varia de acordo com a faixa etária e as necessidades específicas de cada indivíduo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) indicam as seguintes diretrizes para garantir que o sono atenda às funções vitais do organismo.
– Bebês (0 a 11 meses):
• 0 a 3 meses: 14 a 17 horas por dia, incluindo cochilos.
• 4 a 11 meses: 12 a 16 horas por dia.
O sono nos primeiros meses de vida é fundamental para o desenvolvimento cerebral e crescimento físico, e fortalecimento do sistema imunológico. Cochilos frequentes são normais e necessário nesta fase.
– Crianças (1 a 12 anos):
• 1 a 2 anos: 11 a 14 horas por dia, incluindo cochilos.
• 3 a 4 anos: 10 a 13 horas por dia.
• 5 a 12 anos: 9 a 12 horas por noite.
Nessa idade, o sono é indispensável para o desenvolvimento cognitivo, aprendizagem e regulação emocional. Manter horários regulares para dormir e acordar é importante para criar uma rotina saudável e evitar problemas como déficit de atenção e irritabilidade. Deve-se ter muita atenção com tempo de tela.
– Adolescentes (13 a 18 anos):
• 8 a 10 horas por noite.
Durante a adolescência, o sono é crucial para manter o crescimento e a maturação cerebral. Essa faixa etária, enfrenta desafios como a maior exposição a telas e mudanças nos ritmos circadianos, o que pode resultar em noites insuficientes de descanso.
– Adultos (18 a 64 anos):
• 7 a 9 horas por noite.
O sono de qualidade é essencial para manter o sistema cardiovascular saudável, regular os hormônios e prevenir doenças crônicas como diabetes e hipertensão. A privação de sono nessa fase pode levar a déficits cognitivos, aumento do estresse e problemas de memória.
– Idosos (65 anos ou mais):
• 7 a 8 horas por noite.
Nesta fase diminui-se ligeiramente a necessidade de sono, mas a qualidade do sono é importante. Distúrbios como insônia e apneia do sono são mais comuns nessa faixa etária, o que exige atenção redobrada para manter a saúde geral.
VDN: Por que o sono adequado é tão importante?
Dr. Amaral: O sono é uma necessidade biológica essencial para a manutenção da saúde e do bem-estar como:
– Prevenção de doenças crônicas: O sono apoia na regulação do sistema imunológico, os níveis hormonais e o metabolismo, reduzindo o risco de diabetes, hipertensão, obesidade e doenças cardiovasculares.
– Saúde mental: Dormir bem melhora o humor, reduz os níveis de stress, ansiedade e é fundamental para prevenir transtornos como a depressão.
– Desempenho cognitivo: O sono de qualidade promove a consolidação da memória, aumenta a capacidade de concentração e melhora a produtividade e a tomada de decisões.
– Recuperação física: Durante o sono, o corpo repara tecidos, recupera músculos e libera hormônios de crescimento, essenciais para atletas e para pessoas que buscam um estilo de vida ativo.
– Equilíbrio emocional: O descanso adequado permite ao cérebro processar emoções e regular comportamentos.
Manter horários regulares para dormir e acordar também é fundamental para estabilizar o ritmo circadiano, o relógio biológico interno que regula o ciclo de sono e vigília. Um ritmo circadiano equilibrado melhora a profundidade e a qualidade do sono.
VDN: O que acontece no corpo durante as fases do sono?
Dr. Amaral: O sono não é uniforme, e sim um ciclo dinâmico que alterna entre diferentes fases, cada uma com funções vitais para o corpo e a mente. Em uma noite normal, passamos por quatro a seis ciclos de sono, compostos por fases não-REM e REM.
Estágios do Sono Não-REM:
– Estágio 1 (N1): Transição para o sono leve: Este é o estágio inicial, quando você passa do estado de vigília para o sono.
Características: Relaxamento muscular, redução da frequência cardíaca e espasmos ocasionais.
Duração: 1 a 5 minutos.
Função: Preparar o corpo para o sono mais profundo, reduzindo a atividade sensorial e cerebral.
– Estágio 2 (N2): Sono leve e intermediário
O estágio mais longo do ciclo, onde passamos cerca de 50% do total de sono.
Características: Batimentos cardíacos e respiração mais lentos, diminuição da temperatura corporal e aparição de atividade elétrica no cérebro (fusos do sono).
Duração: 10 a 60 minutos por ciclo.
Função: Manutenção da estabilidade do sono, prevenindo acordar facilmente por estímulos externos.
– Estágio 3 (N3): Sono profundo
Também conhecido como sono de ondas lentas, é a fase de descanso mais profundo.
Características: Frequência cardíaca e respiratória significativamente reduzidas, relaxamento muscular completo e ondas cerebrais lentas.
Duração: 20 a 40 minutos (mais longo na primeira metade da noite).
Função: Liberação do hormônio do crescimento, reparação de tecidos, fortalecimento do sistema imunológico e restauração física.
Sono REM (Rapid Eye Movement):
O sono REM ocorre cerca de 90 minutos após o início do sono e repete-se ao longo da noite, com períodos mais longos na segunda metade.
Características: Movimentos rápidos dos olhos, ondas cerebrais semelhantes ao estado de vigília, respiração e frequência cardíaca mais rápidas, e paralisia muscular para evitar que o corpo “reagir” aos sonhos.
Duração: 10 a 60 minutos por ciclo.
Função: Consolidação da memória, processamento emocional, criatividade e aprendizado. Os sonhos são mais realistas nessa fase.
VDN: Qual importância do Equilíbrio entre as Fases do Sono?
Dr. Amaral: Um sono saudável não depende apenas da quantidade de horas dormindo. Cada fase desempenha um papel único: o sono profundo é crucial para a recuperação física, enquanto o sono REM promove saúde mental e funções cognitivas.
VDN: Quais fatores Interferem nos Ciclos do Sono?
Dr. Amaral: Idade: Recém-nascidos passam cerca de 50% do tempo em sono REM, enquanto adultos ficam entre 20-25%.
Idosos têm menos sono profundo, o que pode afetar a recuperação física.
– Exposição à luz: Luz artificial pode atrasar o sono, especialmente se usada antes de dormir, interferindo no ritmo circadiano.
– Distúrbios do sono: Apneia obstrutiva e síndrome das pernas inquietas dividem os ciclos, comprometendo a qualidade do sono.
– Álcool e substâncias: Consumo de álcool pode diminuir o sono REM no início, causando uma compensação desorganizada nos próximos ciclos.
– Padrões recentes de sono: Noites mal dormidas acumulam “dívidas de sono”, prejudicando a capacidade do corpo de alcançar ciclos regulares, mesmo quando os fatores externos são corrigidos.
As fases do sono são fundamentais para a restauração do corpo e da mente. Se você perceber que não está atingindo as fases mais profundas ou REM de forma regular, pode ser um sinal de que algo está interferindo na qualidade do seu descanso. Ajustes simples na rotina e um ambiente de sono adequado podem fazer a diferença.
VDN: O que é higiene do sono?
Dr. Amaral: A higiene do sono é o conjunto de práticas, hábitos e condições que levam a ter um sono de qualidade. Essas estratégias ajudam a regular o relógio biológico,não se limitando apenas ao horário de dormir, envolvem ajustes no estilo de vida e no ambiente ao longo do dia. Pequenas mudanças podem fazer uma grande diferença na qualidade do descanso, prevenindo insônia, cansaço crônico e garantindo um descanso adequado e reparador.
VDN: Quais as práticas de higiene do sono?
Dr Amaral: Estabeleça horários regulares: Vá para a cama e acorde no mesmo horário todos os dias, incluindo fins de semana. Essa consistência ajuda a regular o ritmo circadiano, facilitando o adormecimento e a sensação de alerta ao despertar.
– Crie um ambiente ideal para dormir: O quarto deve ser escuro, silencioso e com uma temperatura confortável. Use cortinas blackout, protetores auriculares ou máquinas de ruído branco, se necessário.
– Evite telas antes de dormir: A luz azul emitida por celulares, computadores e televisores inibe a produção de melatonina, dificultando o sono. Desconecte-se ao menos 1 horas antes de dormir.
– Quarto é para dormir: Evite usar a cama para atividades como assistir TV, trabalhar ou comer. Isso ajuda o cérebro a associar o ambiente do quarto exclusivamente ao descanso.
– Pratique atividades relaxantes: Crie um ritual noturno, como tomar um banho quente, ler um livro leve ou meditar.
– Controle a alimentação à noite: Evite refeições pesadas ou ricas em açúcar e gordura antes de dormir, pois elas podem dificultar a digestão. Melhor escolher lanches leves e evitar cafeína e álcool nas horas que antecedem o sono.
– Exercício físico regular: A atividade física melhora a qualidade do sono, se possível evite exercícios intensos nas 3 horas antes de dormir, visto que podem ser estimulantes.
– Evite cochilos prolongados: Se precisar cochilar, limite o tempo a 20-30 minutos e evite cochilar após o meio da tarde, para não atrapalhar o sono noturno.
– Exponha-se à luz natural durante o dia: A luz do dia ajuda a regular o ciclo sono-vigília, promove a sensação de alerta durante o dia e facilitando o sono à noite.
Se mesmo praticando essas orientações, continuar enfrentando dificuldades para dormir, é fundamental procurar um médico.
Dormir bem não é apenas um hábito, é uma necessidade e investimento indispensável para saúde e o bem-estar. O sono reparador contribui para dias mais produtivos, maior equilíbrio emocional e uma vida mais longa, feliz e saudável. O sono deve ser uma prioridade, sua mente e corpo vão agradecer.
Dr. Ricardo Amaral Filho (@anaralfilho)
Mestre em Educação e Saúde/ Médico de Família e Comunidade/ Médico do Esporte