Patrocinada pela oposição, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigará as fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) será comandada pelo Centrão. Parlamentares de partidos do centro devem concentrar a presidência e a relatoria do colegiado, que será composto por deputados e senadores.
Com aval do governo, que busca controlar a comissão, o senador Omar Aziz (PSD-AM) será indicado para presidir o colegiado. O congressista é aliado ao governo, mas tem perfil pragmático e já fez críticas à gestão petista.
Como presidente, Aziz terá o controle da pauta e decidirá, por exemplo, quando a comissão terá reuniões e quais pedidos serão pautados. Em 2021, Aziz presidiu a CPMI da Covid, que investigou as ações e omissões do governo de Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia.
Apesar de cobiçada pela oposição e pela base governista, a relatoria também deve ficar nas mãos de um parlamentar de um partido de centro.
A decisão envolve o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que negocia um nome de “equilíbrio”. Ele sinalizou ao líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), que a oposição não teria o cargo de relator já que a presidência não foi dada ao PT.
Integrantes da oposição questionam a escolha de nomes do Centrão para o comando da CPMI e temem que o colegiado repita o ocorrido com a CPMI do 8 de janeiro, que também foi criada a pedido da oposição, mas teve controle do Centrão e protagonismo da base governista.
A CPMI está agora na fase de articulação para as indicações dos seus integrantes. Os partidos iniciaram os debates internos nos últimos dias sobre quais nomes cada sigla indicará.
A comissão será composta por 15 deputados e 15 senadores titulares e igual número de suplentes. No total, 60 nomes deverão ser indicados pelos partidos, de acordo com o princípio da proporcionalidade partidária. Pela regra, os maiores blocos e partidos têm direito a mais vagas.
A primeira sigla a definir suas indicações foi o PSD. A legenda anunciou a escolha do deputado Sidney Leite (PSD-AM) como titular e do deputado Carlos Sampaio (PSD-SP) como suplente.
Governo negocia
A gestão petista tentou inicialmente barrar a criação da CPMI. Sem forças e uma base sólida no Congresso, o governo decidiu articular para minimizar o possível desgaste. No Executivo, ministros fizeram coro para lançar dúvidas sobre a necessidade da comissão de inquérito, já que autoridades já atuam na investigação das fraudes
A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, responsável pela articulação com o Legislativo, defendeu que a comissão tem potencial menor de alcance investigativo e pode, inclusive, atrapalhar as apurações que já estão em curso.
O novo ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, também endossou a tese. Ele e o ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, também defenderam que a CPMI pode atrapalhar o processo de ressarcimento das pessoas que sofreram descontos não autorizados em seus benefícios.
O principal desafio dos aliados do governo será reverter a narrativa que associa as fraudes do INSS ao Executivo, por isso, o PT também mira escalar integrantes “combativos”. Integrantes da base governista esperam que o relator tenha perfil “investigativo” e que a CPMI não vire palanque eleitoral.
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência, é o primeiro nome escolhido pelo PT para a CPMI.
Oposição
O PL terá direito a seis vagas na CPMI, entre titulares e suplentes. Em comissões de inquérito é comum que os parlamentares que apresentaram o pedido de criação do colegiado ocupem as funções principais. Com a CPMI do INSS, esse não deve ser o caso.
Envolvidos nas articulações para criar a comissão, os deputados Coronel Chrisóstomo (PL-RO) e Coronel Fernanda (PL-MT) foram descartados para a relatoria, mas são cotados para compor a CPMI.
A bancada do PL ainda deve realizar reuniões internas para oficializar os nomes escolhidos e definir sua “tropa de choque” no colegiado. A sigla tem 90 deputados e vários reivindicam vaga no colegiado.
Um dos integrantes da direita com maior engajamento nas redes sociais, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) também é um dos que reivindicam uma cadeira na CPMI. O parlamentar é visto como um triunfo da oposição por ter grande alcance nas redes e já ter conseguido abalar a imagem do governo em outras ocasiões, como a crise no Pix no início do ano.
Outros nomes ventilados são o da deputada Bia Kicis (DF) e o do senador Rogério Marinho (RN), líder da oposição no Senado.
Criação da CPMI
A CPMI foi criada na terça-feira (17) após leitura de pedido em sessão do Congresso. A expectativa inicial da oposição era que a leitura do requerimento ocorresse em sessão no dia 27 de maio, mas o presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (União-AP), decidiu adiar para junho a sessão conjunta.
A decisão deu tempo ao governo para articular. Antes do adiamento, Alcolumbre teria alertado o governo que seria inevitável não instalar a comissão e sugerido como opção adiar a sessão do Congresso para o governo ganhar tempo.
O requerimento de criação da CPMI recebeu o apoio de 36 senadores e 223 deputados. Além da deputada Coronel Fernanda, a iniciativa foi articulada pela senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
Antes, a oposição mirou criar uma CPI da Câmara, mas teve os planos frustrados por Hugo Motta que alegou já haver uma fila de pedidos de CPI aguardando criação. A estratégia então mudou para emplacar um colegiado misto, de deputados e senadores.
Em maio, Nikolas Ferreira chegou a apresentar no Supremo Tribunal Federal (STF) um mandado de segurança para solicitar a instalação imediata da CPI do INSS na Câmara. Hugo Motta pediu à Corte que não atendesse à solicitação do deputado.
Próximos passos
Para começar a funcionar de fato, agora os partidos devem finalizar as escolhas dos nomes e Alcolumbre deve marcar a data de instalação da CPMI. Com o calendário apertado até o recesso parlamentar, que começa em 18 julho, Alcolumbre sinalizou a líderes que os trabalhos da comissão só devem começar no segundo semestre.
Pelas regras do Congresso, o colegiado deverá iniciar os trabalhos com a eleição do presidente e vice do colegiado. A escolha, apesar de ir a voto, costuma ser fruto de acordos políticos. Uma vez eleito, o presidente designará o relator da comissão – que também é definido conforme a negociação política.
Depois de instalada, o prazo de funcionamento da CPMI será de 180 dias (seis meses), com despesas de funcionamento estimadas em até R$ 200 mil.
Fraudes no INSS
Os descontos ilegais na folha de pagamentos de aposentados e pensionistas tiveram início em 2019. O esquema foi revelado, em abril, após operação da Polícia Federal (PF) e Controladoria-Geral da União (CGU). A chamada Operação Sem Desconto já teve cinco fases, com prisões e apreensões realizadas.
O rombo estimado é de cerca de R$ 6 bilhões. O esquema envolvia a atuação de entidades de classe, como associações e sindicatos, que realizavam os descontos mensais sem autorização.
A investigação trouxe indícios de que a fraude começou no governo Bolsonaro, mas os descontos nos benefícios do INSS atingiram cifras bilionárias em 2023, já no primeiro ano do governo Lula.
Depois de revelado o esquema, o INSS informou que recebeu mais de 3,1 milhões de solicitações de revisão relacionadas à cobrança não autorizada de mensalidades.