O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), divergiu do relator Alexandre de Moraes e acolheu, nesta quarta-feira (10), a maioria das questões preliminares pedidas pelas defesas dos réus da trama golpista. A única preliminar rejeitada foi a que pedia a anulação da delação do tenente-coronel Mauro Cid.
Na votação de recebimento de denúncia, em abril, Fux havia dito que via com “reserva” a quantidade de depoimentos prestados pelo tenente-coronel.
No julgamento desta quarta, porém, afirmou que analisou todo o processo e que constatou que Cid, de fato, havia sido chamado outras vezes para esclarecer fatos novos que surgiam no decorrer da investigação.
O ministro sinalizou que deve acompanhar o entendimento de Flávio Dino e manter os benefícios previamente acordados com Cid, o que inclui perdão judicial.
Outra surpresa se deu em uma preliminar que foi acolhida e que representa uma contradição do próprio ministro. Fux votou para acolher o pedido do deputado federal Alexandre Ramagem e suspender por completo a ação penal contra ele.
Ramagem é o único dos réus a não responder pelos cinco crimes imputados pela PGR (Procuradoria-Geral da República), já que teve dois delitos suspensos pela Câmara dos Deputados.
A ação do Legislativo foi homologada parcialmente pelo STF em maio, quando os ministros consideraram que crimes após a diplomação de Ramagem poderiam ser suspensos.
Na ocasião, Fux também votou para acolher a suspensão de forma parcial, ou seja, imputar somente três crimes a Ramagem. No julgamento desta quarta, porém, o ministro mudou de posição.
Incompetência do STF e da Turma
Em coerência com o que já havia votado no julgamento de recebimento da denuncia da PGR, Fux votou pela incompetência absoluta do STF para julgar parte dos réus da ação sobre o golpe. Segundo ele, a maioria dos réus deveria ser julgada por tribunais de primeira instância.
“Nós estamos julgando pessoas que não têm foro privilegiado”, afirmou o ministro.
Fux criticou ainda o fato de a previsão de foro privilegiado ter passado por inúmeras mudanças, causando uma “banalização” dessa competência constitucional.
O ministro ressaltou de modo crítico que uma das mudanças foi feita após os atos criminosos da trama golpista.
Ele se refere à alteração no regimento que permitiu o STF julgar, com foro privilegiado, pessoas que já deixaram o cargo público, mas cometeram os crimes durante o mandato.
Essa alteração permitiu que Jair Bolsonaro fosse julgado pelo STF, ao invés de ter o caso analisado por tribunal comum.
Ele também acolheu a preliminar que pedia a incompetência da Primeira Turma, para julgar Bolsonaro. Segundo ele, se o ex-presidente fosse julgado com foro privilegiado, deveria ter o caso analisado pelo plenário da Corte, assim como teria qualquer presidente da República.
Cerceamento de defesa
Fux também acolheu a preliminar dos advogados que alegaram cerceamento de defesa em razão do pouco tempo hábil para análise de grande quantidade de provas, a qual chamou de “tsunami de dados”.
O ministro disse que ele mesmo teve dificuldade de escrever o voto em razão do número de conteúdos a serem analisados.
Votos
Relator do caso, Alexandre Moraes votou para condenar Bolsonaro e outros sete réus.
Para Moraes, Bolsonaro foi o líder do que seria o grupo que tramava o golpe. Junto ao ex-presidente, o relator votou pela condenação de:
- Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor-geral da Abin (Agência Brasileira de Inteligência);
- Almir Garnier, almirante de esquadra que comandou a Marinha no governo de Bolsonaro;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro;
- Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) de Bolsonaro;
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
- Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro; e
- Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil no governo de Bolsonaro, candidato a vice-presidente em 2022.
O voto de Moraes durou cerca de cinco horas e teve quase 70 slides para apresentação do relatório. O ministro também dividiu sua manifestação em 13 pontos que narraram, em ordem cronológica, como teria atuado a organização criminosa pelo golpe.
Flávio Dino acompanhou o relatório de Moraes, estabelecendo o placar de 2 a 0. Uma eventual condenação é confirmada com a maioria de três votos. Além de Fux, ainda votam Cármen Lúcia e Cristiano Zanin (presidente da Turma), nesta ordem.
Por quais crimes os réus foram denunciados?
Bolsonaro e outros réus respondem na Suprema Corte a cinco crimes. São eles:
- Organização criminosa armada;
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
- Golpe de Estado;
- Dano qualificado pela violência e ameaça grave;
- Deterioração de patrimônio tombado.
A exceção fica por conta de Ramagem. No início de maio, a Câmara dos Deputados aprovou um pedido de suspensão a ação penal contra o parlamentar. Com isso, ele responde somente aos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
Cronograma do julgamento
Restam três para as sessões do julgamento. Veja:
- 10 de setembro, quarta-feira, 9h às 12h;
- 11 de setembro, quinta-feira, 9h às 12h e 14h às 19h;
- e 12 de setembro, sexta-feira, 9h às 12h e 14h às 19h.